Espaço de Pesquisas
Oi! Este é um espaço do qual você pode pesquisar e encontrar histórias de mulheres que participaram do nosso projeto por todo o Brasil! Legal, né?
Pra usar, basta digitar no espaço de pesquisa alguma palavra-chave, por exemplo: alguma profissão, alguma cidade, algum tema...
É o nosso verdadeiro banco de dados - o primeiro, da história das mulheres que se relacionam afetivamente
com mulheres - e precisa ser valorizado! ♥
197 resultados encontrados com uma busca vazia
- Talita e Anne
Talita e Anne acreditam que, depois de batalhar tanto por esse amor, o relacionamento que possuem hoje é o único que aconteceu de forma saudável na vida delas - e por isso, mas não só, é o melhor. O amor é a base de tudo o que fazem e nele está a presença, a paciência, o acolhimento.. Não querem passar raiva. A paz que encontram juntas não trocam por nada. É com os passeios dos cachorros na rotina que detalham vivenciar na casa “do meio do mato” que elas sorriem contando sobre o amor. Pensam como sempre desejaram isso: viver com alguém que aceitasse a forma como são. Pela religião que eram inseridas, acreditavam que isso não era possível - não para elas. Sempre foi negado. O encontro que possuem e o fato de terem achado seu lugar no mundo é sempre um motivo de celebração. Sobre a religião, Talita lembra do dia que a mãe dela perguntou no telefone como a Anne estava. Era um ato simples, mas a validação da existência da Anne, sabendo a importância que ela possui para a Talita, mesmo existindo o preconceito, foi o divisor de águas e um dos maiores atos de amor. Tanto Anne, quanto Talita e suas famílias eram da igreja petencostal Congregação Cristã (mas calma, não foi lá que se conheceram). Acredito que essa é uma informação bastante relevante porque a Congregação é uma das religiões mais conservadoras do Brasil. Suas famílias seguem frequentando a igreja (e comentam que isso, inclusive, aproxima as mães que perguntam uma sobre a outra), mas acreditam que foi justamente por conta do grande tabu e do próprio preconceito contra seus corpos que demoraram tanto para se entender enquanto mulheres que amam outras mulheres. Anne, apenas aos 32 anos de idade, conseguiu sentir coragem de assumir que estava num relacionamento. Até essa idade, tratou namoradas como amigas, não enfrentou ninguém da família e teve medo. Precisou de muita coragem, ter 100% de sustento e independência para conseguir falar sobre. No primeiro momento, a mãe ficou bastante triste. Dois anos depois, conheceu Talita e hoje em dia elas se amam, passam dias juntas e possuem uma ótima relação, mas entende o quanto o processo foi longo, resgata tudo isso com muito pesar. Talita também demorou para entender e aceitar o que estava vivendo, até mesmo conversar com suas amigas, sua psicóloga, mudar o Tinder para “mulheres” e não “homens”. Foi só aos 32 anos que conseguiu se permitir. Anne comenta que na igreja falavam em tom de alerta que as meninas lésbicas chegavam fazendo carinho no cabelo para seduzir as meninas héteros e levar para um caminho ruim… e acrescenta sobre a solidão em que passou por tudo isso: “Quem me dera se alguém tivesse me feito um carinho no cabelo quando eu era jovem”. No momento da documentação, Talita estava com 34 anos. Ela é natural do sul de Minas Gerais, mas mora em Campinas há vários anos, quando se mudou para estudar. De qualquer forma, sua família ainda mora em Minas, numa região bastante próxima de São Paulo, então brinca que é mais paulista que mineira. Hoje em dia, ela trabalha enquanto jornalista e funcionária pública, adora tirar fotos de natureza e bichos, também escreve para uma revista de engenharia elétrica. Anne, por sua vez, estava com 37 anos no momento da documentação. Ela é natural de Campinas, interior de São Paulo. Trabalha enquanto técnica judiciária e vai se formar em direito em 2024. Anne adora cozinhar, plantar e formar jardins. Possui um hobbie do qual mistura raízes, descobre novas plantas e até faz uma espécie de alquimia, com raízes, plantas, álcool… Mora em uma casa grande, então adora pesquisar, encontrar plantas em extinção e plantar, cuidar, descobrir cheiros, sabores e espécies brasileiras. Anne também é apaixonada por romances lésbicos - os brasileiros, já leu todos - e está desbravando internacionais… são mais de 150 livros lidos. A história delas começou por conta de amigas que tinham em comum (mais especificamente, a prima da Anne), mas não sabiam da existência uma da outra. Foi em 2019 num aplicativo de relacionamento, que de fato, se conheceram, descobriram as amizades que ligavam, conversaram, se acharam interessantes e decidiram se encontrar. Adoravam a mesma cantora em comum (que não era alguém conhecida), a Anne apareceu na casa da Talita cheia de sacolas com comidas, estavam grudadas demais em pouco tempo e… quando viram já estavam apaixonadas. Quando a pandemia começou elas quase não se encontravam. Anne ia até a prefeitura onde Talita trabalhava, elas sentavam uma ao lado da outra em um banco, ambas de máscara, ficavam conversando, mas havia muito medo do Covid-19. E assim seguiram por meses. Hoje, enxergam tudo diferente. Sentem que estão num período muito bom. Possuem seu relacionamento de forma assumida, se sentem livres para viver esse amor. Talita explica que por mais doloroso que tenha sido, foi bonito também… Entende que existiu respeito. De alguma forma, a família passou por cima da fé para acolher elas… E isso foi muito importante. Em muitos momentos difíceis, Anne se isolou para passar por eles de forma sozinha e Talita teimou em estar junto. Tentava sempre explicar que queria estar em todos os momentos - nos felizes e nos tristes - e que não adiantava ela se reclusar. Hoje, Anne não faz mais os movimentos de sair. Ela explica que não teve mais momentos tão tristes, mas que mesmo se tivesse, já se acostumou com a Talita enquanto companhia e vai querer a companhia dela para dividir a dor. Numa pausa, ela conta como enxerga Talita enquanto uma mulher muito forte. Talita rebate, diz que ela não é forte, só não pensa muito, vai lá e resolve. Sempre se viu assim, muito prática. Anne completa: “É forte.” Na rotina, elas dividem o tempo entre ficar no apartamento da Talita e na “casa do mato” da Anne. Lá, adoram passear com os cachorros, ficar no sofá assistindo filme e dormindo. Talita ajuda a sogra a fazer ‘Duo Lingo’ (porque está aprendendo inglês), organizam as coisas da Anne (que é bagunceira) e Anne faz comidas gostosas. Por fim, adoram viajar juntas (e começaram a viajar no começo do namoro, o que era novo para as duas). Entendem que o namoro foi intenso desde o começo, talvez foi por isso que deu tão certo. Talita conta que gosta de como tudo aconteceu, de como estão agora, das amizades dela (várias amigas senhoras de idade, acha isso o máximo e Anne brinca zoando ela) e do cotidiano bastante caseiro que possuem enquanto um casal. ↓ rolar para baixo ↓ Talita Anne
- Karol e Beatriz
Não tem jeito, preciso começar essa história falando sobre como a Karol e a Beatriz se conheceram. Poderia dar uma introdução dizendo quem elas são, o que elas gostam de fazer, enrolar vocês… mas não tem como. Não tem. Essa história é insuperável pra mim. Talvez por ser uma daquelas que eu queria ter transformado num podcast porque o áudio é muito mais engraçado do que eu escrevendo (alô, roteiristas dos streamings do momento, estão preparadxs?)... ou talvez porque não seria nenhum pouco justo deixar o melhor para o final mesmo. Só algumas informações importantes: hoje em dia a Karol tem 27 anos e a Beatriz 26 anos. Ambas são do interior de São Paulo, mas de cidades interioranas diferentes. A década (meu deus, a década é ótimo. risos) era de 2000-2010 e uma das coisas que fazia muito sucesso era o famoso bate-papo UOL... foi lá que Karol conheceu uma pessoa chamada Tânia. A conversa entre elas fluiu bem e ela adicionou a Tânia no MSN, no Orkut e a Tânia foi apresentando de forma virtual outros amigos dela (a Maiara, a Poliana e o Gustavo). A Karol, com o passar do tempo e o “convívio” diário, descobriu um interesse pela Tânia, foi aí que elas começaram a webnamorar (SIM, jovens, a Karol praticamente fundou o webnamoro). Quando todos os amigos conversavam em grupo no MSN o ícone de webcam ficava visível, então ela sabia que todos ali possuíam webcam, mas por algum motivo os amigos não gostavam de ligar e sempre quem ligava na chamada era ela e o Gustavo (ou seja, ela só conhecia a Tânia por fotos). Isso já faz muito tempo, né gente? Então precisamos lembrar que naquela época era super normal as pessoas se mostrarem muito menos que hoje em dia na internet (e serem muito menos cobradas por isso também). Com o passar do tempo e do webnamoro se desenvolvendo, todos ali criaram laços muito fortes. Na época, a Karol estava na escola, o Gustavo estudava teatro e viajava por São Paulo e a Tânia passou por um período muito difícil em que a mãe ficou muito doente. Foi um tempo em que o Gustavo (que morava na mesma cidade) a acolheu em casa, já que a mãe dela foi internada e depois de um tempo a mãe dela veio a falecer. Isso gerou um choque bem grande para todo o grupo, já que eles trocavam muitas mensagens diárias e, principalmente na Karol, pelos sentimentos que ela tinha pela Tânia, somados ao fato de ser menor de idade, estar em uma cidade distante e não saber como poderia ajudar nesse momento. Ela conta que lembra de nessa época uma outra menina do grupo, a Poliana, também estar passando por dificuldades e o quanto ela comentava em casa com a mãe sobre essas amigas, sobre querer ajudá-las… e o quanto isso também a angustiava. Mais uma vez o tempo seguiu e um belo dia, alguém a adicionou no MSN… o MSN, pra quem não sabe, não é uma rede social da qual você posta coisas... era tipo um Whatsapp, apenas um bate-papo. Ninguém adicionava lá sem te conhecer. E então, essa pessoa que adicionou a Karol do nada, chegou logo soltando um: “POR QUE VOCÊ ESTÁ NAMORANDO A MINHA NAMORADA?”. Que? Pois é. Eu também soltei isso quando eu ouvi. Essa pessoa, é a Beatriz. Vamos à versão da Beatriz. Beatriz conheceu a Tânia jogando um jogo, o Habbo (só quem viveu, sabe, né? como era bom ser jovem nos anos 2000). As duas conversavam bastante e a Tânia também apresentou o Gustavo para ela… com o passar do tempo as coisas se desenvolveram na conversa e elas também começaram a webnamorar (as precursoras do webnamoro, parte 2). No caso, a Karol e a Beatriz foram as precursoras do webnamoro e da traição do webnamoro, ou seja, o webcorno. Até que um dia O GUSTAVO (gente… a balbúrdia) chamou a Beatriz para dizer “que tinha uma menina dizendo que estava namorando a Tânia” (!!) e ela disse “como assim, eu sou namorada da Tânia, não tem essa!!” (risos) e então ela foi tirar satisfação com a Karol, assim, adicionando no MSN. Se fosse o MSN Plus na versão 2009, garanto que tinha até aquele efeito de som no fundo que dizia “eu estou sentindo uma treta!!!” Quando a Karol e a Bea conversaram elas entenderam que não ia dar certo e decidiram de alguma forma se afastar da Tânia. Elas não lembram especificamente como aconteceu, mas o afastamento rolou. A Karol começou a se envolver com uma menina na cidade em que ela morava e a Bea foi seguir a vida dela também, sem mais contatos com a Tânia e os webamigos dela. Mas calma, aí você pensa… ah, só isso? a Tânia nunca mais apareceu? kkkk meu amor… o mundo não dá uma volta, não. Ele dá um duplo twist carpado. Pois um dia chega o Gustavo (logo quem…) chama a Bea no MSN e dá a triste notícia: a Tânia morreu. .. que²? Ela estava enfrentando um período de muita tristeza e depressão após a morte da mãe dela e cometeu suicídio. Ao saber da notícia, tanto a Bea, quanto a Karol, ficaram muito mal. Foram dias de choro, um sentimento de dor estranha e uma sensação de perda imensa. Novamente venho lembrar que: hoje em dia é muito fácil para nós, que vivemos em uma década depois, num momento em que a internet está muito mais avançada, pensar que algo nessa história estava muito estranho. Mas precisamos nos transportar para os anos 2000-2010 e lembrar que por lá estava tudo bem as coisas não terem muito encaixe, né? Foi no momento após o luto que a Bea teve uma luz e entendeu que as coisas não tinham encaixe, que a história que o Gustavo estava contando era muito ríspida, muito estranho falar sobre uma depressão assim… e foi então que resolveu dar uma de stalker. Ela começou a ler o Orkut da Tânia que ainda estava ativado, pesquisou pelo nome do colégio que aparecia na foto dela de uniforme e viu que o colégio não ficava em São Paulo… TCHARAM! Começou a ir mais a fundo nas buscas do próprio colégio e… finalmente achou o perfil da menina verdadeira, descobrindo, assim, que a Tânia nunca existiu. Gente. Vocês têm noção??? A pinta nunca existiu. Se ela nunca existiu, ninguém ao redor dela existia também! Com isso caindo por terra, ela foi descobrindo uma série de fakes que o Gustavo tinha. Inclusive, por um momento, pensou que até mesmo a Karol fosse um dos fakes, mas entendeu que não era e chamou ela para conversar e contou tudo… e ela ajudou nessa busca por mais fakes. Até hoje elas acreditam que a única verdade em toda a história é que o Gustavo trabalhava com teatro (não por ele ser um ótimo personagem, porque o que ele era tem nome: criminoso, rs) mas porque ele viajava bastante pelo interior de São Paulo fazendo peças. A primeira atitude que elas tiveram foi falar com a menina que ele usava as fotos para se passar por Tânia, mas ela nem ligou, não deu bola. Então elas não souberam mais o que fazer. Elas desmascararam ele nas redes sociais e alertaram as meninas que estavam próximas dele para que se afastassem, mas naquela época os crimes virtuais não eram considerados, então era realmente muito difícil conseguir barrar o Gustavo, ainda mais elas sendo menores de idade e ele não. Foi muito engraçado pensar em toda a história e ouvir toda a história sendo contada por elas, da mesma forma que é muito incrível ver a forma que elas ressignificam algo que poderia ter sido traumático e horrível (como foi o período conversando com esse cara e com seus vários personagens), mas a única coisa que elas tentam pensar sobre, é que foi por conta disso que elas se conheceram e que passaram a ficar todos esses anos juntas e que isso, sim, foi bom. De qualquer forma, não queremos NUNCA, JAMAISSSSS, deixar de lembrá-las que os tempos atuais são outros e que precisamos denunciar homens iguais o Gustavo! Ele tinha um perfil MUITO claro: meninas, novas, lésbicas (que estavam se descobrindo) e provavelmente em algum momento usaria de tudo o que sabia sobre elas para se aproximar fisicamente, então, por favor: denunciem! Hoje em dia já temos leis, já temos um preparo e uma consciência maior e não podemos deixar nenhum caso passar. Além disso, Gustavo, se um dia você ler isso: a gente ainda consegue te enquadrar em crimes cibernéticos, seu escroto! :) Agora, sim. Ufa, essa história é boa demais. Depois que o crime foi desvendado e que as duas ficaram iguais aos integrantes do Scooby-doo tirando as máscaras dos inimigos e descobrindo que são todos a mesma pessoa, a Karol, que vivia um relacionamento um tanto quanto abusivo, foi meio que “proibida” de continuar conversando com a Bea porque a namorada estava com ciúmes… mas ela estava muito intrigada com essa história, não estava acreditando no que tinha vivido (também pudera… né?) e deu um jeito de continuar falando (!!hahahahaha). Elas resolveram se encontrar pessoalmente um tempo depois numa cidade que ficava entre as cidades em que elas moravam (Praia Grande e Vargem Grande Paulista), e essa cidade foi Cotia. Lá elas se viram para ficar em silêncio, basicamente (kkkk), porque estavam com vergonha e não tinham o que dizer. No fim, elas não se beijaram (obviamente, porque a Karol namorava, né? se não conversaram, imagina beijar kk) e na hora de ir embora pra ter um grand finale a Karol li-te-ral-men-te caiu no colo da Bea dentro do ônibus (!!!) quando ele freiou. Nessa época, a Bea começou a fazer faculdade em São Paulo, então ela ia diariamente e voltava para a capital (ou, algumas vezes, ficava na casa da tia). Era uma rotina exaustiva e durou muito tempo. Por outro lado, a Karol terminou o relacionamento e cerca de um mês depois a Bea soltou um “ah então agora a gente pode namorar, né?” e ela disse um “é.” pois foi assim que começaram a namorar. Quando se viram pela segunda vez, já estavam namorando. Com as fundadoras do webnamoro não se brinca, né? A Bea ainda teve a patchorra de soltar um “primeiro a gente namora, depois a gente beija” hahhahaha. Quando elas já estavam namorando, a Karol passou em um curso que acontecia em São Paulo também, então elas acabavam se encontrando durante a semana na capital. Elas contam que o começo do namoro foi bastante difícil porque tinham realidades muito diferentes. A Karol tinha uma condição financeira mais conflituosa, precisava correr muito atrás para conseguir as coisas e pela condição da Bea ser mais favorável ela não tinha consciência de classe e consciência dos privilégios que o dinheiro trazia. A Karol se sentia bastante triste, não conseguia acompanhar e trazia muito do antigo relacionamento junto com ela… para elas mudarem isso e se equilibrarem exigiu um esforço em conjunto de cederem e se entenderem aos poucos. Entenderem os limites, abrirem mão de algumas coisas para ouvir mais a outra… e por aí vai. Foi nesse período de equilíbrio e de entenderem que estaria dando certo que a Bea sentiu que era o momento de contar à família sobre o relacionamento delas. Ela deixou uma carta para a mãe antes de sair de casa a caminho da aula em São Paulo e, quando a mãe dela acordou e leu, ligou para ela e elas conversaram. Foi um momento que misturou um choque, com um “é isso mesmo que você quer?” e um tentar respeitar ao máximo. Com o tempo, a mãe e o pai da Bea foram entendendo e respeitando, assim como o resto da família e hoje em dia super apoiam as duas ♥ Depois do fim da faculdade, elas decidiram que seria legal escolher um apê e irem dividir uma vida sob um lar. Foram morar juntas em Cotia, a famosa cidade, lá da primeira vez em que se viram. A Karol trabalha lá até hoje escrevendo notas no cartório, mas elas já estão morando em outro apartamento, na cidade de São Paulo. Hoje em dia, adotaram gatinhos, se desenvolveram profissionalmente e a Bea é analista de marketing. Hoje em dia, a Karol e a Bea fundaram uma marca de camisetas para o público lésbico (que inclusive já apareceu no Documentadas), a @vestsapatao! Conversando sobre marcas LGBTs, elas comentaram que geralmente produtos LGBTs focam no público masculino, desde o nome (gay gay gay gay gay) até as coisas serem sempre arco-íris, unicórnios, coisas de homens afeminados, confetes e quando pensam na sapatão é só a mulher tipo caminhoneira e/ou a Ana Carolina/Maria Gadu. Automaticamente imaginam a lésbica como masculina. Enquanto elas não se enxergam nem enquanto masculina, nem enquanto feminina, mas enquanto duas mulheres que se amam, apenas. Além disso, falam também sobre a importância de fazerem roupas em modelos maiores porque só encontram coisas pequenas que caminham entre o P e o M e que elas pensam em corpos grandes porque se identificam assim. A VestSapatão é da gente e para a gente. ♥ As duas também estão noivas! O pedido foi feito em Ubatuba, num comecinho de dia super fofo e estão planejando uma boa festa depois da pandemia. A Karol, quando fala no amor, acredita que amar é transparente e verdadeiro. Completa que sente que não existe nada que não possa ser compartilhado com a Bea. A Bea diz que a relação exige muito respeito, respeito por quem elas são e por quem querem ser. Esse respeito resume a liberdade. E diz que aprendeu a amar e a respeitar com as mulheres da família dela, porque a mãe dela tem 8 irmãs, que são muito diferentes, mas que são grandiosas de amor, de criação e de laço, porque sempre tiveram respeito. Quando pergunto se elas gostariam de mudar algo na cidade em que elas moram, sendo São Paulo a residência, ou Cotia na convivência, elas dizem que gostariam de mudar a forma que são tratadas pelos homens, por sempre ouvirem comentários (ou por sermos colocadas como quem quer roubar o lugar deles). Além disso, falam que gostariam de um lugar com segurança, porque lá em Cotia não conseguem caminhar nas ruas de mãos dadas. Bea comenta a importância de ver escolas falando sobre a diversidade e o quanto isso mudaria as nossas vidas, traria consciência para as pessoas desde a educação de base. É algo que ela gostaria de ver diretamente. Ela acredita que ninguém quer ser ignorante e fala sobre a família dela, no caso, as avós, estarem querendo entender e se esforçando ao máximo para compreender o relacionamento que ela têm com a Karol - e que o papel dela, nessa história, é de ensinar e explicar, dar o suporte para que elas entendam e vejam que está tudo bem… para conseguirmos, assim, quebrar o preconceito. A história da Bea e da Karol te ajudou de alguma forma? Gostaria de mandar uma mensagem para elas? Beatriz Karol
- Maiara e Vitoria
A Vitória e a Maiara possuem um relacionamento a distância, vivendo entre as capitais do Rio de Janeiro e de São Paulo. A Vitória veio para o Rio uma vez só, enquanto a Mai vai com maior frequência, adora São Paulo e pretende morar lá em breve. Nos encontramos no Parque Ibirapuera. Elas gostam de estar em parques, com a canga no chão, sentadas ou deitadas, falando sobre a vida. Adoram visitar museus e restautantes também. Além disso, a Vi gosta de fotografia, faz poledance, escreve bastante e antigamente elas até trocavam poemas. Enquanto a Mai jogava bastante futsal e adora cozinhar. Elas acreditam que hoje em dia tudo tende a ser mais acelerado (os áudios, as rotinas, os fluxos das coisas) e isso acaba fazendo com que a gente não preste tanta atenção no outro. Então talvez o que elas querem de verdade parece ser mínimo, mas se trata de uma essência: se cuidar. Resgatar um senso coletivo - sermos menos robotizados, acelerados nas ruas - e olhar pra você sabendo quem você é, para então poder amar o outro sendo quem o outro é também, sem medo de sofrer por conta disso. A Vitória tem 21 anos, mora em São Paulo e faz faculdade de moda, com estágio em figurino. Já a Maiara tem 27 anos, mora no Rio de Janeiro e faz faculdade de engenharia química. É assistente em uma grande empresa de cosméticos, trabalha na área de análise de dados. Elas se conheceram no início de 2016, através do Facebook. Na época, adicionavam várias pessoas que possuíam amigos em comum. A Maiara achou a foto da Vitória muito bonita, porém o status dela estava como “relacionamento sério” e ela não puxou nenhuma conversa. A verdade por trás dessa história é que não existia nenhum relacionamento, tudo era uma brincadeira entre a Vitória e uma amiga dela por conta de um homem que estava dando em cima dela. Por fim, o tempo passou, a Mai também se envolveu com uma menina em um relacionamento que acabou não sendo muito bom pra ela e desistiu de puxar assunto com a Vitória. Um tempo depois, no Snapchat, rede social pioneira nas postagens em formato de storie, a Vitória postou vídeo recitando um poema dela. A Mai respondeu sobre o jeito que ela falava a palavra “amor”, por conta do “r” ser puxado, e achar isso muito fofo. Elas conversaram um pouco e isso foi o bastante para desenvolver o interesse. Um tempo depois, começaram a se relacionar de forma online, pois para ambas ainda era muito difícil se encontrarem pessoalmente por questões financeiras e o alto custo das passagens de São Paulo para o Rio de Janeiro. Quando se encontraram pessoalmente pela primeira vez, já em 2017, a Maiara foi até São Paulo. Ambas passaram por processos para contar aos familiares que estavam se relacionando, a Maiara contou para a irmã que já imaginava e que acompanhou ela nessa viagem, então foi a primeira a saber e foi logo no início. A Vitória contou um tempo depois, imprimiu umas fotografias que tiraram e mostrou para a mãe, contando ser a namorada. A mãe processou isso durante um tempo, o irmão dela já sabia (e até já conhecia a Mai), então ajudou na conversa também. Ela deixou a Mai frequentar a casa e depois da primeira vez que foi mais delicada, passou a adorar as visitas. Hoje em dia a Mai vai bastante para lá e elas se dão muito bem, prepara feijão preto, saladas e tudo na mesa vira discussão quando ela não come muito. Quando a Vi foi uma vez ao Rio, em 2018, passou um feriado. A frequência que elas se encontram depende muito, antes era cerca de três vezes ao ano, agora aumentou um pouco porque pelo homeoffice a Mai pode ficar um tempo a mais em São Paulo. Mas a distância ainda apresenta dificuldades, as despedidas não são fáceis, por isso desejam a mudança. A Maiara fala que, por ser muito fã da Maria Rita, sempre que pensa no amor lembra quando ela canta: ‘’Se perguntarem o que é o amor pra mim, não sei responder, não sei explicar… Só sei que o amor nasceu dentro de mim, me fez renascer, me fez despertar’’. Ela entende que essa é a sensação que o amor traz, principalmente o amor que elas estão criando juntas. Despertando um novo mundo, uma nova possibilidade. “A Vi é meu primeiro relacionamento sério com mulher. Não que eu tivesse um histórico grande com homens. A Vi é meu relacionamento concreto. É essa relação de cumplicidade e suporte, sabendo que tô fazendo bem pra ela e que ela também tá me fazendo bem.” A Vi fala que além da construção, é política e luta. No dia anterior à nossa conversa, por exemplo, elas foram em um bar sapatão. Ela conta o quanto foi importante ter ido lá, o quanto foi diferente ter ido num ambiente confortável pra gente. “Me senti confortável pra amar e poder fazer o que todo mundo faz.” a Mai complementa com “Poder dar a mão, beijar, fazer carinho. O que é trivial pra todo mundo…” Para a Vitória, estar com a Maiara é se sentir em casa. Ela sabe seus defeitos, mas ela não vai embora por causa disso. Ela ama e isso é o que importa. Maiara Vitória
- Jéssica e Mariana
Jéssica e Mariana nunca tinham parado para refletir sobre a sua história com tanta precisão… e também nunca se viram compartilhando sobre quem são, como se sentem juntas e suas visões de mundo, como aconteceu quando se encontraram com o Documentadas, em São Paulo. Ao se dar conta de estarem fazendo isso pela primeira vez, Jéssica logo verbaliza como está se sentindo sortuda. Não só em poder compartilhar as vivências, mas principalmente por viver com a Mari. Diz que sente muita potência em viver juntas, são companhias e companheiras. Como são pessoas que passam muito tempo trabalhando, entendem que todo o tempo livre deve ser desvinculado do dinheiro. Por isso, adoram desfrutar de um banho compartilhado, de uma boa música, um chá, os jogos de videogame, passeios, horas montando quebra-cabeças, assistindo filmes, séries, passeando no carrinho (que é o xodó da vida delas) e indo numa doceria que fica próximo de casa e que valorizam muito. São extremamente apegadas ao que é artesanal, familiar, simples e cuidadoso. A semana que nos encontramos não estava sendo nada fácil para elas. Além de perdas familiares, viveram uma situação de assalto em que quebraram o vidro do carro no semáforo e roubaram os pertences. Para além do prejuízo financeiro, ficou o trauma e a tristeza por lidar com uma situação de invasão, de injustiça com algo que é tão valioso para elas e que foi tão batalhado para ser conquistado. Mari explica que vivenciando essa situação percebeu o quanto amadureceram - enquanto um casal e enquanto indivíduos - durante o período que estão juntas. No momento de dor, se reaproximam, precisam da outra. O relacionamento é um espaço de cura. Desejam rir e querem fazer uma à outra sorrir. Por serem muito semelhantes, chega a ser difícil achar algo que não concordam, então raramente brigam (quando brigam, não dura quase nada). Nisso, até nos momentos mais violentos recentemente vividos, se fortaleceram. Mariana, no momento da documentação, estava com 29 anos. Trabalha enquanto analista de dados e é natural de Guarulhos, região metropolitana de São Paulo. Jéssica, no momento da documentação, estava com 31 anos. Trabalha enquanto analista de dados e é natural de Juiz de Fora, interior de Minas Gerais. A história da Mari começa quando ela se formou em saúde pública, no fim de 2019, e começou a estudar sobre o Coronavírus que estava surgindo na China. Na época ela transitava entre procurar emprego e tentar iniciar o mestrado. Sonhava em estudar na Fiocruz, já que era uma referência, mas a família achava o Rio de Janeiro muito perigoso. Até que, já em 2020, a mãe soube que a Fiocruz estava abrindo mestrado e avisou ela, que tentou e passou… Como a pandemia já estava acontecendo, suas aulas seriam online e a mudança não foi necessária. A Jéssica, por sua vez, morava no Rio e já cursava o mestrado de Estatística na Fiocruz. Sentia falta da área da saúde no seu currículo e foi cursar, teve as aulas paradas durante a pandemia… Quando voltou, em formato online, acabou caindo na mesma turma que a Mari. Foram pelas aulas de mestrado que acabaram se conhecendo e em janeiro de 2021 começaram a conversar. Jéssica resolveu perguntar para uma amiga em comum se ela sabia se a Mari ficava com mulheres e se estava solteira… Não esperava que a amiga iria contar para a Mari. Então, num dia que Jéssica postou uma música da Lana Del Rey nos stories, Mari interagiu, começaram a conversar e nunca mais pararam. Contam que passavam tanto tempo conversando que iam dormir tarde da madrugada e acordavam cedo ansiosas para continuar a conversa. Antes mesmo de se conhecer pessoalmente, já namoravam. Em março, a Fiocruz solicitou alguns documentos e a Mari precisou vir ao Rio de Janeiro. Então, aproveitaram a oportunidade para se conhecerem e passarem uns dias juntas na casa da Jéssica. Naquela época, não estavam saindo de casa por conta da pandemia de Covid-19. Mesmo que as coisas já estivessem caminhando para a flexibilização, ainda não tínhamos vacina e, ainda mais elas, que trabalhavam estudando isso, faziam de tudo para ficar em casa. Falam como foi horrível a despedida, a ideia de se distanciar novamente. No dia, Mari até perdeu o voo - e nem por um erro delas, mas porque a torcida do Flamengo estava no aeroporto esperando os jogadores chegarem, o que é uma discrepância… enquanto elas estavam fazendo de tudo para não sair, ter uma torcida aglomerada num aeroporto… - então acabou tendo que voltar de ônibus, foi uma confusão. Depois disso, se viram novamente alguns meses depois, em maio. Em julho, Jé conheceu a família da Mari em São Paulo. E pouco tempo depois saiu do emprego no Rio, devolveu o apartamento e voltou a morar com os pais em Juiz de Fora. Foi quando surgiu o convite para morar com a Mari e os pais dela em Guarulhos, já que São Paulo tem muito mais oferta de emprego e elas poderiam ficar juntas. Ela topou, a mudança foi em outubro de 2021. Desde então, já conquistaram o emprego fixo, o carro e um apartamento, do qual estão esperando ansiosamente para ficar pronto. Os olhos brilham quando falam das coisas conquistadas em dupla. Essa história foi documentada em 17 de junho de 2023. ↓ rolar para baixo ↓ Jéssica Mariana
- Samantha e Camila
Quando lancei o Documentadas uma mulher lá de Campinas entrou em contato comigo dizendo que queria que eu fosse para lá registrar ela e a namorada e eu respondi aquilo que todas encontram aqui no site quando se inscrevem: se arranjarmos mais casais que topem participar, maior a chance de eu ir (pela possibilidade de organizarmos vakinhas, pela demanda, organização, etc). Passaram três meses e, por mais que a Camila vez em quando aparecia inbox dizendo "não esqueci de vocês, tá?" eu pensava "tá! hahaha vamos organizar!" e achava que de fato iríamos organizar, porém não naquela hora… ATÉ QUE ela surgiu dizendo que tinha organizado 10 casais que topariam participar, com horário, agenda, local, doação garantida e tudo o que tinha direito. Fiquei chocada, pensando: será que ela realmente existe??? E aí ela me contou o motivo: eu quero que o Documentadas venha para Campinas porque preciso do Documentadas registrando o pedido de casamento que vou fazer para a Samantha! Tá explicado, né? O casamento de duas mulheres é capaz de mover o que for, inclusive levar o Documentadas até Campinas. Depois que confirmamos a ida e que comprei as passagens, comecei a participar ativamente da preparação do pedido de noivado das duas - que até então seria uma surpresa para a Samantha. Precisávamos manter a seriedade e o segredo para que ela não desconfiasse de nada (e eu não poderia deixar escapar nenhum detalhe pelo perfil do .doc), então deixei para divulgar só quando já estivesse lá. Fiquei hospedada na casa dela, tomando todos os cuidados, detalhadamente, perante à pandemia. E diferente dos outros casais com quem tenho contato e converso, fiz uma imersão na vida dessas duas ♥ - foram três dias vivendo a realidade delas, ouvindo suas histórias, vivendo a rotina e trocando conhecimento. Ao chegar lá, minha mala virou a mala do noivado, enquanto a Sá trabalhava fomos em lojas de decoração, compramos confetes, comidas, acessórios de festas... e a ansiedade da Camila virou a minha - então fiquei a responsável por organizar como seria o momento - e bloquear a Samantha no perfil do Documentadas no Instagram (fingindo que eu estava sem internet!) para que ela não visse as publicações em que eu contava para o público da página que o pedido de casamento seria feito durante as fotografias do .doc (e que eu iria transmiti-lo ao vivo). Bom, aconteceu! Deu tudo certo. Fomos para uma chácara, junto com a Clara e a Mayara, que também estarão com suas histórias aqui no Documentadas e que auxiliaram em toda a surpresa. A Cami estava tão, tão, tão ansiosa que quase colocou tudo a ser descoberto várias vezes? Sim. Eu fingi que estava irritada para a Samantha não desconfiar de tanta ansiedade 'à toa' no ar? Também! [O que a gente não faz... né?] E ela realmente não esperava, foi lindo. Vocês podem conferir as fotos do momento aqui ♥ Camila tem 35 anos, atualmente trabalha como barbeira e tem um espaço em que atende os clientes lá em Campinas, mas conta que já trabalhou com quase tudo nessa vida: já trabalhou em navio, já foi babá, já foi garçonete, é longa a lista! Morou muitos anos na Europa, em alguns lugares diferentes, foi lá que se entendeu enquanto uma mulher lésbica e decidiu voltar para o Brasil um pouco antes da pandemia pela necessidade de se ver um pouco mais próxima da família e cuidar da saúde mental. Foi aqui que ela conheceu a Samantha, que tem 27 anos, é bancária mas também não perde a oportunidade de fazer um freelance no fim de semana e ganhar uma renda extra! Falando em renda, juntas elas lançaram o Laricas.com, uma marca de comida, vendem salgados de festas, salgados maiores e alguns doces também. A mãe e a avó da Sá participam do empreendimento, ajudando nas vendas e na produção. Quem começou tendo a ideia, na verdade, foi a mãe; As duas toparam, a avó que é super conhecida no bairro por ter várias amizades e organizar bingos decidiu ajudar nas vendas e na divulgação e então todas começaram a vender juntas. A Cami costuma fazer as entregas e elas vendem pelo próprio Instagram (no Instagram no .doc, você chega até elas e por lá pode encomendar, se morar em Campinas ♥ garantimos: é bom demais!). As duas nasceram no mesmo bairro, cresceram na mesma região e descobriram muitas coisas em comum, mas só foram se conhecer mesmo há 2 anos e meio atrás, através de um aplicativo de relacionamento para mulheres, o Wapa. Conversaram pouco por lá, cerca de uma semana e a Cami lembra que tinha algo no perfil da Sá sobre ela gostar de queijo, então decidiu que iria mandar uma foto de uma tatuagem que ela tem que é um queijinho e pensou "ah, vai que rola, né???". E rolou. De lá, ela comentou sobre uma festa que iria acontecer, com música eletrônica em uma parte da cidade, era uma festa cheia de drags, um público bastante ‘underground’... E a Samantha contou que estaria fazendo um freelancer nessa festa! Foi então que elas marcaram rapidamente de se encontrar. A Cami estava enfrentando um momento muito sério e difícil na depressão, não se sentia bem e inclusive, ir para a festa, foi bem delicado. Não queria estar lá, não estava legal e até pediu para que a mãe a levasse porque não poderia ir dirigindo e também não tinha dinheiro para o Uber ou o táxi. Quando ela chegou, encontrou uns amigos e comprou uma cerveja para impressionar, porque o dinheiro era limitadíssimo, mas o charme ela não abriu mão e quando foi fumar na rua a Sá passou por trás dela e encostou a mão nas suas costas, dando um 'oi', mostrando que a viu... e ela brinca 'Aí garanti minha carona para ir embora'. No dia da festa ela realmente garantiu a carona para ir embora, a Sá deixou ela em casa e perguntou o que ela ia fazer durante a semana, se elas podiam se ver... E bom, ela estava totalmente trancada num quarto escuro em depressão, claro que não tinha nada agendado para fazer durante a semana. Topou o encontro. Esse encontro virou outro, e outro, e outro. 28 dias depois elas começaram a namorar, no dia dxs namoradxs de 2019. As famílias admiram muito o relacionamento das duas e elas entendem que é pelo tanto que se ajudam. A Sá chegou naquele quarto escuro, literalmente, trazendo luz. Ela chegava e abria as janelas, falava "nossa, tá muito escuro aqui!" e saía abrindo tudo. Mudava as coisas de lugar, fazia ser diferente. E a Cami se permitia mudar. Da mesma forma que a Cami, nesses 2 anos, vêm trazendo diversas novas perspectivas para a Sá - trouxe a terapia, um novo olhar sobre o trabalho, a vida dela, a forma que ela vê os outros... tudo é muito mais saudável. Desde o primeiro momento em que eu estive com elas percebi o quanto as realidades delas são diferentes, a Cami vem de uma família onde o pai é provedor, enquanto a Samantha é uma casa que só tem mulheres fortes e independentes. O tempo todo a Cami lembra o quanto conviver na casa da Samantha muda o olhar dela sobre as coisas e o quanto aprende sobre a sociedade. A mãe da Cami, por sua vez, considera tanto ambas famílias uma coisa só que sempre fala: ‘’A Samantha é gente da gente’’. Juntas, a Samantha e a Camila adotaram duas cachorras, a Cacau e a Tulipa (Tuli, para os íntimos). Elas amam a rotina com as "crianças": cuidar delas, assistem vídeos de adestramento, sonham em trabalhar com animais, ter alguma creche de cães ou um hotel... em casa tem as duas cachorras, o cachorro da avó e um papagaio também da avó, todos encantadores (Principalmente a vó! Que é um amor e joga bingo como ninguém!). Elas adoram, no fim da tarde, ir na Pedreira do Garcia com as cachorras brincar, correr e se divertir. Além disso, costumam comemorar coisas dentro da própria rotina. Comemorar de um jeito único. Desde aniversários de namoro, aniversários das cachorras, datas que elas adotaram, momentos que elas consideram especiais... Comemoram o crescimento, a conquista, o sonho em conjunto. A Cami completa "Tem outra coisa que a gente faz, a gente ri muito. Tipo, toda a noite junto, é engraçado. A Sa riu tanto ontem que disse ’Mor, eu não tô enxergando’’. Eu amo fazer ela rir." Por fim, elas sonham com um dia em que vão fazer esse casamento acontecer de fato e ter filhos, para além das "crianças" caninas. Querem que seus filhos vivam num mundo diferente do que vivemos. A Cami demorou 27 anos para se assumir lésbica, para se permitir esse entendimento também e não quer mais ver as pessoas passando pelo mesmo que passou, não quer ver as pessoas dentro desse armário. Deseja que as pessoas vivam com respeito e dignidade. Ela quer permitir a educação de forma livre, como não foi permitida à ela, porque acredita que assim seria o mundo ideal: livre. E que isso seja ensinado na escola, que ao redor dos filhos delas o contato com o mundo seja plural e diverso. A Sá conta que quer espelhar a realidade dela para o mundo: com mulheres fortes, guerreiras e independentes, que não abaixam a cabeça e não se diminuem. Ela sempre teve um círculo LGBT muito presente, desde pela melhor amiga da mãe ser solteira com um filho gay, até a avó que também tem amigas lésbicas... E sobre como tudo sempre foi visto com a naturalidade que é. Ela quer isso para o mundo, até porque, o amor, em si, é simples. E o que nós, LGBTs, fazemos é: amar. Ambas falam do amor e do respeito como base de tudo, desde a família (a Cami relembra em alguns momentos que todos os dias quando era criança a mãe dela acordava ela falando o quanto ela era muito linda. E que isso é uma coisa que ela carrega como referência de afeto, para si e para os outros), até os amigos ou um desconhecido por quem sentiu empatia. Elas falam também da importância do amor próprio e do autoconhecimento. Você aprende a se respeitar também, entender o seu limite. O amor próprio vem com muito custo, é uma jornada bastante longa, mas que vale a pena porque respinga nos outros amores de um jeito positivo. Para finalizar, deixo um trecho em que a Camila fala sobre amor que me marcou bastante perante o diagnóstico dela de ansiedade, o que ela sente sobre o amor e a forma que ela entende o amor entre mulheres: "A Sá me trouxe um amor diferente, que é um amor calmo. Sei que não vai ser só calmo, mas a gente vai enfrentar. Teve uma coisa que ela me falou e me marcou muito, é que eu sempre fiquei muito na defensiva e ela olhou pra mim e falou e disse ‘’A gente tá no mesmo time’’. Aí eu posso puxar essa deixa pra falar sobre o amor entre mulheres: por mais que a gente tenha caminhado juntas, dessa vez é de igual, é entender de uma forma que eu nunca antes fui entendida." Samantha Camila
- Sofia e Carol
Entre tudo o que gostam de fazer juntas na rotina caseira num apartamento no centro de da cidade, Sofia e Carolina descobriram o maior dos hobbies em comum: o gosto pelo café. Apelidaram carinhosamente de “ritual”, mas estudam, adoram organizar todos os equipamentos e descobrir novos tipos de grãos. É o momento mais precioso dentro de casa. Sofia, no momento da documentação, estava com 47 anos. Ela é natural de São Paulo, trabalha com um blog de viagens e morou um tempo em Salvador. Carol, no momento da documentação, estava com 38 anos. Ela também é natural de São Paulo e trabalha enquanto fisioterapeuta. Brincam sobre como são pessoas preguiçosas, porque só vão em shows que tenham assentos e que não são muito festeiras, não curtem muito viver o carnaval. Por outro lado, adoram explorar a cidade de outras formas, como andar de bicicleta e de moto. Desejam em breve começar viagens juntas de moto para lugares um pouco mais distantes que o comum. Carol entende que foi Sofia quem trouxe ela de volta à vida através do amor. Foi esse amor que permitiu um redescobrimento sobre quem ela era: desde usar o cabelo que sempre quis (mas que nunca pode por conta de outro relacionamento bastante abusivo), até usar as roupas que deseja sem sentir medo de acharem que ela “está muito sapatão”. Entende, agora, que isso nem é um problema - o problema era ela não viver a vida antes. Hoje, acredita nas energias, nas espiritualidades. Sente que o caminho delas estava para se cruzar há muito tempo e que isso só aconteceu para crescerem juntas, pois estão sempre dispostas uma para a outra. Foi através do Happn, um aplicativo de relacionamentos, que o caminho delas literalmente se cruzou. Sofia, antes de entrar no aplicativo, foi casada por 11 anos. Decidiu baixar e se render à tecnologia porque antes, em outra época, isso não era possível. O ‘match’ aconteceu no final de dezembro, dia 28, mas não se encontraram até o réveillon (ela tentou, Carol não se sentiu confortável sendo tão rápido). Dia 31, foi para Salvador, passar a virada do ano. Conversaram pelo Whatsapp por um tempo, compraram um ingresso para o show do Milton Nascimento que teria em São Paulo (e era uma boa desculpa para se encontrarem pela primeira vez). Porém, a conversa foi esfriando até a data chegar. Sofia estava decidida: iria se mudar para Salvador. Conseguiu um apartamento lá para alugar, conheceu pessoas e se interessou afetuosamente por uma delas… Quando voltou, não sentia mais tanto clima para interagir com a Carol, então marcaram de pegar o ingresso e tomar um café antes do show, como amigas. Inicialmente, a ideia não era nem verem o show juntas, se não sentissem à vontade. Mas ao chegar no café, conversaram por duas horas e se deram muito bem. Decidiram ir ao show, encontraram uma amiga da Carol antes, beberam cerveja e depois do show continuaram a noite em um buteco. Porém, mesmo ficando até 4h da madrugada na noite, existia uma questão: a mudança para Salvador era na manhã seguinte do show. Depois do buteco/e do show, quando chegaram em casa, se falaram pelo Whatsapp e abriram o jogo: sentiram muita vontade de se beijar. Até cogitaram se reencontrar, mas o dia estava quase amanhecendo, a mudança teria que acontecer, Sofia também pensou na pessoa que gostava em Salvador e seguiu seu caminho. Carol ficou triste, passou uns dias bastante abatida, parecia que tinha vivido um término de namoro. No dia 2 de fevereiro, logo em seguida, chegou a ir para Salvador porque já tinha a viagem agendada com uma amiga, mas lá não encontrou Sofia. Depois disso, a pandemia começou e ficou tudo mais difícil. Sofia começou relacionamentos por lá, mas seus planos de viver a cidade em si não deram certo, acabava a maior parte do tempo trancada em casa. Carol, por sua vez, vivia outra situação em São Paulo. Conta que por cerca de 6 anos se relacionou com uma pessoa, que chegou a morar com ela. Não era um namoro porque elas não assumiam (nem publicamente, nem aos mais próximos). Ela já tinha rompido essa relação, porém, quando a pessoa descobriu a existência da Sofia, ‘mudou’ suas atitudes e quis estar de volta. Acontece que as atitudes não mudaram, de fato. Aos poucos Carol entendia o quanto isso era abusivo. O fato de ter gostado de alguém virou um fantasma na vida dela, uma sombra. A pessoa olhava o celular dela o tempo todo, tudo virava uma briga, o nome da Sofia sempre rondava a casa. Acabou bloqueando Sofia no Instagram, como forma de tentar cessar as brigas. A importância que Carol vê em falar sobre essa vivência vai muito de encontro ao que ela viu na Sofia como uma oportunidade de viver algo que sempre quis, um relacionamento assumido, com afeto, sem cobranças sobre como ela deve se vestir, que respeita como ela é, com comunicação. Mas além disso, fala muito também sobre precisarmos falar que existem relacionamentos abusivos entre mulheres e que precisamos nos conscientizar. Não relativizar quando as pessoas nos fazem sentir mal, nos cobram, nos ditam o que devemos ser, desconfiam. É preciso buscar acolhimento e sair dessas situações. Depois desse hiato em que Sofia viveu Salvador na pandemia e Carol se livrou mais uma vez daquele relacionamento que vivia, decidiu adicioná-la no Instagram novamente, porém por outro perfil. Conversaram sobre a pandemia, sobre a vida, e passaram a se comunicar novamente todos os dias. Um tempo depois, Carol comprou uma passagem e foi para Salvador. Elas não sabiam se iriam se dar bem, era uma primeira convivência de dias, mas tudo deu certo. Depois disso, Sofia também veio a São Paulo, ficou um bom tempo. Aos poucos, foi conhecendo sobre a relação que Carol viveu e trazendo acolhimento. Queria muito pedir ela em namoro, achava que ela merecia isso, e o pedido acabou acontecendo nessa vinda, quando aproveitaram e foram para um chalé na serra paulistana. Viveram a distância Salvador - São Paulo por um tempo, ainda na pandemia, e estava tudo bem difícil. O contrato da Sofia estava próximo de vencer, então pensou em voltar para São Paulo. Decidiram morar juntas, justificam: “Se a Carol fosse morar em Salvador, ela iria morar comigo. Por que eu vindo pra cá não poderia morar com a Carol?”. Depois da mudança, casaram-se. No dia de Iemanjá. Sofia e Carol adoram as coincidências que possuem juntas. Para além do café, as músicas, os lugares… Sofia fala como é importante poder ser quem ela é de verdade com a Carol, como ela nunca tinha vivido isso de forma tão plena, a forma que se sente à vontade com alguém, em liberdade. Carol só conseguiu entender a relação que viveu depois que passou por tudo. Hoje em dia, valoriza o quanto ela e a Sofia podem ser quem são na rua, nas redes sociais, podem pegar na mão quando saem pela cidade. E aprende diariamente a viver uma relação saudável, a superar os traumas e a não querer pesar as coisas. Adora a rotina agradável que vivem. Ambas mudaram muito suas visões sobre o amor depois que passaram a se relacionar. Não são muito próximas de suas famílias e nem possuem um número extenso de amigos, mas os que existem são pessoas que amam, confiam, que estão na vida delas há anos. Entende respeitar o tempo de cada pessoa, o limite das coisas, é o essencial para que tudo dê certo. Querem um amor leve, que conversa e que entende. ↓ rolar para baixo ↓ Carolina Sofia
- Louise e Thayane
Louise e Thayane constroem sua vida numa base de amor e afeto familiar muito grande - tanto que soa meio impossível falar delas sem falar em família. O tempo todo enquanto nos conhecíamos, visitando o lar em que moram no centro de São Paulo, a sensação mais presente era de que ali existe uma família. Elas são naturais do Rio de Janeiro, mas se mudaram há pouco tempo para São Paulo por conta do trabalho da Louise. A casa, aos poucos, vem tomando forma, mas o mais importante é o samba, que toca o dia todo, embalando as atividades cotidianas. A música, na vida de ambas, vem desde crianças: suas famílias são muito ligadas ao samba, nos encontros cantam, fazem bagunça, gostam do movimento. Para o futuro, planejam filhos, uma família cada vez mais unida, grande e que valoriza suas raízes. Acreditam que enxergar o futuro enquanto uma construção é também um ato de amor. Tanto a Thay, quanto a Louise, no momento da documentação, estavam com 30 anos. A mudança para São Paulo foi bem rápida, durante o processo seletivo que a Louise participou elas conversaram e decidiram que só daria certo se fossem juntas, não cogitaram viver num relacionamento à distância. Hoje em dia, o trabalho da Louise envolve coordenação de vendas, enquanto a Thay é geóloga, apaixonada por defesa civil e está estudando para o concurso público dos Bombeiros. Diariamente ela corre, nada, cuida do corpo para a prova física e estuda para a prova teórica. Ambas têm a paixão do samba e do futebol em comum, mas com isso vem o motivo das brigas na relação: uma é Flamengo, a outra, Vasco. Querendo ou não, o amor que elas possuem pelo Rio é enorme, são pessoas que iam muito à praia, amam o sol, os bares… então está sendo uma nova vivência descobrir São Paulo. Por outro lado, sentem o quanto são companheiras juntas, o quanto mesmo com as dificuldades e a saudade da família elas se apoiam e se fortalecem estando nesse novo local. Tentam explorar a cidade descobrindo novos restaurantes, botecos, eventos com samba e culinárias diferentes. Quando elas se conheceram, a Thay estava em um relacionamento que ia muito mal, chamou uma amiga para conversar porque precisava desabafar e a amiga perguntou se podia levar outra amiga. Na hora, ela pensou que não era o ideal, né? Afinal, teria uma desconhecida ouvindo suas lamúrias, mas tudo bem, aceitou. Quando chegou lá, a menina convidou uma pessoa que ela estava ficando para as encontrar e a Thay pensou “Pronto, mais uma desconhecida pra me ouvir desabafar…” e então chegou a Lou. A Lou estava um pouco irritada, tinha saído do trabalho num dia bem agitado, mas segundo a Thay ela estava com uma roupa maravilhosa e isso já a chamou atenção. Depois desse primeiro dia, a Thay terminou seu relacionamento e todas elas (a Thay, a amiga dela, a Lou e a pessoa com quem ela estava ficando) passaram a se encontrar com frequência. No início de 2019 surgiu um flerte entre a Thay, a Lou e a menina que ela se relacionava. Elas ficaram e o que era para ser um divertimento acabou se tornando um relacionamento entre as três: durou oito meses. Por fim, não deu mais certo, terminaram, mas a Thay e a Louise continuaram juntas - tiveram a ideia de recomeçar devagar, e quando perceberam já estavam 100% entregues e vivendo como casal. Um tempo depois, com o início da pandemia, o que tinham era uma a outra e um quintal para ver o céu. Isso foi um espaço de precisarem aprender a se comunicar de forma fluida, já que tudo dependia das duas. Uma foi contando cada vez mais com a outra. Elas acreditam que, por mais que tenha existido muita coisa ruim na pandemia, há o sentimento de que esse tempo serviu como um acelerador de futuros: se a coisa não foi pra frente, ela acabou ali - e o que foi pra acontecer, aconteceu de verdade. Foi um momento divisor de águas em que elas sentaram e repensaram o futuro: planejaram o que gostariam de ser, estando juntas, tendo filhos, uma carreira, etc. Hoje em dia, mesmo a Thay que não é de falar muito o que está sentindo, consegue colocar pra fora com a Lou. Elas sentem que, quanto mais se abre, mais geram apoio uma à outra. Lou conta do momento que ela contou para a mãe dela, já adulta, sobre se relacionar com uma mulher. O medo que existia, pois é muito próxima da mãe, mas entende que ela teve uma criação evangélica muito forte e poderia reagir de várias formas. No fim, ela ficou assustada, mas abraçou e tratou com afeto. Isso se tornou um exemplo do que a Lou espera ser para as pessoas, ela acha que isso é lidar com amor sobre as coisas, e também fala sobre o acolhimento que ela espera ter mesmo nos momentos mais delicados. ↓ rolar para baixo ↓ < Thayane Louise
- Malu e Joyce
Tudo o que envolve a arte une a Joyce e a Malu. Elas amam mexer com tintas, cantar juntas, fotografar, pintar, fazer customização de roupas, assistir filmes… enfim, respiram arte o tempo todo. São pessoas que se enxergam de formas diferentes e que entendem que possuem alguns jeitos diferentes, mas sabem admirar e respeitar os diversos detalhes uma na outra. E, através desses detalhes, elas se encontraram em 2019. Foi uma mecha de cabelo na cor verde da Malu que chamou a atenção da Joyce, que estava sentada na mesa de bar com uns amigos. Na época, a Malu não cogitava em engatar novamente em um relacionamento, visto que tinha recém saído de um e estava ainda se recompondo e reestruturando. Mas hoje, ela conta que chegou a viver momentos em que foi reparando cada palavra e cada gesto, através da presença ativa que construíram no relacionamento, onde entendeu e agradeceu o presente que foi ter aceitado viver essa relação. Ela olha para a Joyce e diz: “Que mulher incrível, que mulher forte” e a Joyce complementa dizendo que nesses momentos, ela também pensou “Meu deus, não acredito que to tendo essa conexão que eu sempre quis ter”. As duas se viram pela primeira vez no bar, em 2019, enquanto cada uma estava na sua mesa, com os seus amigos. A mecha de cabelo verde da Malu chamou a atenção da Joyce, que sempre quis pintar o cabelo de verde. Ela ficou olhando, olhando e olhando… a Malu percebeu os tantos olhares, retribuiu alguns e a Joyce resolveu ir até ela e perguntar sobre o cabelo. O fato é que, quem fez a mecha foi a própria Malu, já que ela é cabeleireira! Então, ela deu um cartãozinho, com o contato profissional para que a Joyce mandasse uma mensagem. Elas brincam porque ambas sabem que o contato no cartão não era apenas por conta do cabelo, mas ele de fato aconteceu: elas conversaram e marcaram de se encontrar. Logo a caminho do local do encontro, o primeiro beijo aconteceu e sentiram que as coisas dariam certo. Na época, a Joyce trabalhava no bar em que elas estavam, mas era dia de folga e ficaram por lá se divertindo com os amigos e conhecidos dela. Ao decorrer do começo do namoro e dos primeiros meses, passaram por muitas coisas juntas e entendem que ao mesmo tempo que o relacionamento em si era algo que trazia o sentimento de leveza, ao redor delas aconteciam muitas coisas, e acabaram passando por todas essas coisas juntas. No período que a pandemia começou, tiveram que enfrentar mudanças, sentiram muitas saudades uma da outra e isso fez parte de um processo grande sobre autoconhecimento também. Nos momentos mais difíceis, não deixaram de se ajudar e de seguir enfrentando os desafios, mesmo entre perrengues e apertos. No fim, mesmo com o começo tendo esse sentimento leve entre as duas, elas se fortaleceram o tempo todo no apoio mútuo. A Joyce tem 30 anos, trabalha como tatuadora e atendente. Atualmente ela mora em Barão Geraldo, distrito de Campinas, interior de São Paulo. Também é cantora e musicista, toca violão, guitarra e ukulele. A Maria Luiza tem 20 anos, é formada enquanto cabeleireira e também trabalha atendendo em uma loja. Mora em Barão Geraldo, também, e no tempo livre ama fotografar e restaurar móveis. Junto com a Joyce, ela criou um projeto para também restaurar e customizar roupas, que se chama Lava. Além disso, elas fazem pulseiras e colares de miçangas. Em novembro de 2020 elas ficaram noivas, durante uma viagem para o Rio de Janeiro, que intitularam como “A melhor viagem da vida!”. O amor de forma leve surgiu porque tanto a Joyce, quanto a Malu, já passaram por relacionamentos que foram mais conturbados e abusivos. Logo no começo do relacionamento, pelo receio de se envolverem com novas pessoas, foi como um trato: só podemos acontecer se formos leves. Um trato que seguiu de forma natural, até porque, a leveza não deve ser forçada. O trato era para que tentassem resolver atritos ou questões sempre da melhor maneira possível, com diálogo, escuta e carinho. A Joyce entende que amar é respeitar e ter confiança, enquanto a Malu entende que amar é ser sincero e ter fidelidade. “Não é uma questão de ser fiel só naquela ideia de traição” ela diz “mas fiel para o que a pessoa se propõe. Se você é um amigo, seja um amigo fiel. É uma escolha”. Comentamos sobre nos sentirmos mais à vontade entre mulheres, porque já vivemos em situação de medo o tempo todo. Elas contam o quanto se sentem bem quando consomem algo feito por mulheres, quando se sentem seguras quando chamam um carro no aplicativo e a motorista é mulher e como a presença feminina em si traz paz. Concluem a conversa dizendo que as mulheres podem chegar aonde quiserem porque têm uma força incrível, só precisamos nos acreditar e nos impulsionar. Temos muita capacidade e maturidade. Além de que, tudo que é feito por mulher é nítido e intenso, sabe ser bonito e forte. Maria Luiza Joyce
- Camila e Rafaela
Rafa e Camila começaram o relacionamento entre passear no parque, ir em livrarias, tomar cafés e caminhar pela rua. Hoje em dia, compartilham o dia com os filhos da Camila, adoram fazer tatuagens (inclusive possuem algumas juntas), debater sobre leituras (e livros escritos por mulheres), tirar fotos e frequentar o local que nos encontramos. Entendem que o relacionamento (e os processos individuais que viveram no período em que se relacionam) fizeram entender o amor sob uma nova perspectiva. Camila agora enxerga o amor enquanto um fenômeno, uma ação que está dentro de tudo o que você faz. Depois que viveu a depressão passou a ver como abertura de diálogo também, ou seja, amar é conviver com conversas difíceis, passar pelas coisas. Sente que é uma pessoa que se fecha nos momentos ruins e a Rafa vem ensinando ela a se resgatar, voltar e compartilhar as dores também no amor. Rafa complementa, fala que respeita a liberdade. Estar presente nesses momentos não é para invadir qualquer espaço, mas sim dizer: “Tô aqui para o que precisar”. Rafaela, no momento da documentação, estava prestes a fazer aniversário. Como a data já aconteceu, o texto foi lançado no momento em que completou 40 anos. Ela é natural de Santos, litoral paulista, mas reside em São Paulo há mais de 10 anos. Trabalha enquanto tradutora e adora música e fotografia, considera grandes hobbies. Camila, no momento da documentação, estava com 39 anos. Ela é natural de São Paulo e trabalha enquanto produtora de eventos. Brinca que seu grande hobbie é dedicar 100% do tempo aos filhos (de 10 e 7 anos), já que ser mãe é o maior desafio que vive. Enquanto pensávamos em hobbies surgiu a brincadeira de que um grande hobbie é o quanto elas gostam de fazer tatuagens, então contaram a história de uma tatuagem em específico, quando tudo começou indo num sebo e achando um livro da Virginia Woolf com uma dedicatória escrito “E isso é só o começo”. Compraram o livro porque acharam lindo, ficaram com isso na cabeça e, numa viagem para a Patagônia, Rafa escreveu isso num guardanapo e mandou para a Camila. Rafa disse que estava doida para dizer que a amava, mas queria dizer pessoalmente, então acabou mandando só a frase numa foto. Resultado: virou uma de suas tatuagens favoritas. Elas se viram pela primeira vez num parque, mesmo já se conhecendo pelas redes sociais. Conversavam online e tinham uma expectativa em se conhecerem, estavam bastante ansiosas - Rafa até levou um presente e conta que falou sem parar. Saíram com a sensação de “Ufa! Aconteceu! Nos encontramos.” Encontraram-se diversas vezes depois disso, foram passeios em cafés, livrarias, praças… conversavam muito e nunca se beijavam. Decidiram então viajar juntas, foram para Visconde de Mauá (uma viagem feita para um casal, com quarto de casal, no inverno, lugar romântico…) e finalmente se beijaram antes do dia da viagem! Ficaram mais tranquilas, com a certeza de que daria certo. Cerca de três meses depois, se afastaram. Camila se sentia muito deprimida por diversas questões em sua vida e se isolou de muitas pessoas. Passou meses triste, em tratamento, e quando decidiu sair desse espaço, nas palavras dela, “do fundo do poço”, contou para todos o que tinha passado: as violências, a depressão… Expôs isso em suas redes e sentiu que quem gostaria de ficar, quem estaria ao lado dela, ficaria. Na versão da Rafa, ela sentiu um baque muito forte com o afastamento da Camila, mas respeitou e tentou curar isso aos poucos. Depois de meses, quando viu o retorno às redes, decidiu que iria mandar uma mensagem. Não queria surgir ‘do nada’ e lembrou que elas tinham um show para irem, pois compraram os ingressos juntas. Decidiu falar “Vamos no show? Não precisamos conversar sobre coisas pesadas, só curtir”… Camila topou e elas foram. O show era do Harry Styles e Rafa não conhecia nada sobre ele, mas Camila apresentou, até hoje ela gosta e escutam bastante juntas. Foi nesse momento, pós show, que se reaproximaram, então ficaram juntas novamente. Aos poucos foram introduzindo as crianças na rotina - e Camila explica que como já teve experiências se relacionando com outras pessoas depois de ser casada e que se afastar dessas pessoas representa um corte abrupto para as crianças, isso precisava ser alinhado com a Rafa; Que a relação com os pequenos é uma relação diferente, o carinho, afeto e vínculo continuam existindo mesmo se um dia elas terminarem. Rafa compreendeu tudo e foi abraçando isso aos poucos, no começo era uma amiga da mãe, então foi introduzindo afetos, elas foram percebendo, perguntando e ficando à vontade com isso. O dia em que contaram mesmo foi no parque (local que inclusive fizemos as fotos), elas estavam sentadas bebendo um vinho, as crianças correndo brincando, um dia bastante frio e todos estavam bastante felizes. Hoje em dia, a Rafa e eles dividem muitos gostos em comum, por exemplo futebol, curiosidades sobre sistema solar… Camila, quando fala sobre a vida socialmente, conta o quanto gostaria de ver o programa educacional mudando, entende que hoje em dia perdemos muito das coisas que realmente devemos aprender. Queria ver as pessoas respeitarem as diferenças de seus filhos, não fazendo-os entrar nas caixinhas. Cita sobre o problema que a filha enfrenta aprendendo a leitura e a escrita, se sentindo algumas vezes excluída, enquanto ela tem muitas coisas incríveis que sabe fazer e que poderia ter isso sendo explorado e valorizado. Deseja ver ela sendo respeitada por completo. ↓ rolar para baixo ↓ Rafaela Camila
- Carla e Nathalia
Conheci a Nath e a Carla quando estive em Campinas, passamos a manhã num parque ecológico que é o lugar preferido delas - espaço que elas costumam ir e passar muito tempo juntas olhando o céu embaixo de uma árvore. As duas são duas mulheres super jovens e absurdamente fortes. A Nath tem 22 anos, estuda pedagogia e vive entre Ribeirão Preto e Campinas, porque fazia faculdade lá, mas com o início da pandemia voltou, para ficar mais próxima da família e da Carla, que faz faculdade de Engenharia de Software e trabalha em uma Startup, ali, em Campinas mesmo. A Carla tem 19 anos, é um pouquinho mais nova, mas elas brincam que essa breve diferença de idade não costuma transparecer em quase nada na convivência nesses anos de relacionamento. Digo ANOS porque elas se conheceram lááá em 2015, quando estavam no ensino médio. Tudo começou por causa de um grupo de Facebook chamado ‘Poxa Sapatão’, em que rolavam brincadeiras das quais você colocava seu nome e a cidade em que morava e conhecia mais meninas que moravam próximas. Assim, elas trocaram contato. Foi bem “emocionado” no começo, no sentido de ser intenso, porque elas passavam o dia inteirinho se falando (ah, o tempo útil na adolescência, né? que saudade), até que começaram a falar por ligações (que chegaram a durar 14 horas! H o r a s!) e foram, também, descobrindo muitas coincidências da vida: que moravam em bairros próximos, estudaram na mesma creche quando eram crianças, fizeram capoeira no mesmo lugar… já se esbarraram por aí muitas vezes, mas nunca tinham, realmente, se visto. Foi em janeiro de 2016 que marcaram de se encontrar em um shopping. Tentaram ir no cinema, porém, naquela época estavam tendo os famosos “rolêzinhos” (grupos de jovens que iam para os shopping em grandioso número e, por muitas vezes gerar tumulto, acabavam sendo barrados ao entrar - lembrando que os rolêzinhos, em definição mais objetiva, sempre foram muito racistas na perspectiva da proibição, pois quem era proibído de entrar no shopping era sempre o jovem negro e, em sua grande maioria, o jovem de baixa renda e periférico). Por conta do “rolêzinho”, a Nath conseguiu entrar acompanhada do pai, mas a Carla, com 14 anos e desacompanhada, foi barrada na portaria do shopping. Elas tiveram que pedir para o pai da Nath ir lá na porta principal buscar a Carla para que ela pudesse ao entrar e, quando elas se viram pela primeira vez, se abraçaram e a Carla quis andar meio que abraçada (com o braço por cima do pescoço) da Nath, só que ela se esquivou em um sentido de “Para! Meu pai tá aqui!” (hahahaha!) e obviamente o pai dela percebeu essa “amiga meio um pouco íntima demais”. Neste dia, finalmente elas conseguiram ir ao cinema. Lá se beijaram pela primeira vez e, depois do quarto encontro, começaram a namorar. O começo do namoro foi bastante escondido, principalmente pela diferença de idade. Elas sentiam bastante medo do que os familiares iriam pensar… e quando a mãe da Carla descobriu ela não aceitou, foi todo um processo (e é ainda) de aceitação. Hoje em dia elas saem juntas e se dão bem, mas entendem que é algo diariamente estabelecido enquanto uma reafirmação. Depois de segurarem a barra na família da Carla, foi a vez da família da Nath. Tudo começou quando ela estava na praia durante uma viagem e deixou o Facebook logado no Notebook da tia… e adivinha qual grupo a tia dela viu? É claro, o Poxa Sapatão! Antes que a tia dela contasse, ela achou melhor contar. Chamou o pai dela e falou sobre o namoro. Ele ficou quieto, não esboçou nenhuma reação. No dia seguinte, fez algumas perguntas para ela, mas em geral, seguiram bem. A mãe dela, por outro lado, teve uma reação mais agressiva, em um sentido de mandá-la procurar ajuda psicológica, dizer que isso era aberração e não aceitar de jeito nenhum. Mais uma vez, elas entenderam que só com o tempo isso mudaria. E estavam certas: hoje em dia, a mãe dela é puro grude com a Carla! E passou a se permitir entender e aceitar o relacionamento das duas. O que também ajudou muito a mãe da Nath no entendimento foi um dia um sermão que ela ouviu na igreja quando decidiu ir atrás da resposta sobre aquilo que a filha estava vivendo e a resposta ser literalmente algo voltado à respeitar a felicidade e a vivência de algo que está sendo tão puro como o amor. ♥ Hoje em dia, por mais que a Carla e a Nath vivam num relacionamento quase que à distância, por conta do tempo em que a Nath passa em Ribeirão Preto estudando e morando no outro apartamento, elas sonham com o momento em que vão estar juntas em um lar só delas ♥ Elas, inclusive, por quererem casar mas entenderem que não possuem condição financeira para isso agora, fundaram um perfil no Instagram: o @rifasporamor (clica aquiii!). Lá elas sorteiam rifas e quem compra colabora com o sonho do lar e do casório! É uma iniciativa fantástica. Além disso, elas fazem diversas ações para falar sobre amor, sobre a quebra de preconceitos e sobre direitos das mulheres para as pessoas que se interessam em comprar as rifas e ganhar os prêmios! Para elas, esse amor que constroem juntas e que querem seguir construindo está relacionado ao cuidado e ao quanto compartilham: seja no diálogo, na forma que se olham ou que se respeitam. A Carla conta que uma vez deu um presente para Nathalia com a frase escrita: “O amor é o mais alto grau da inteligência humana”. E acredita que o amor resume tudo, ele é tudo! As pessoas só chegam em bons lugares pelo amor, mesmo a sociedade estando um caos, o que mantém ela melhorando a cada dia ou as pessoas lutando e tentando melhorar é o amor. O amor por si mesmo, o amor nas relações ou o amor por outras pessoas. “O amor é Deus, é vida”. A Nath é muito grudada na família dela e, uma coisa muito legal que vale comentarmos, é que ela é prima da Camila, companheira da Samantha que também irão aparecer aqui no site do Documentadas! Durante a nossa conversa, ela falou várias vezes sobre algumas pessoas da família, mas em especial da sobrinha, que é o maior xodó e uma criança que ela quer ajudar na criação e na educação. Já a Carla, é muito ligada à religião. Ela é Católica e faz missões na igreja, então se dedica ativamente a falar sobre diversidade, cultura e valores educacionais para pessoas da periferia. Falamos sobre a dificuldade dessas pessoas terem acesso aos locais distantes e ela deu o exemplo claro de como a mobilidade urbana não funciona para as pessoas pobres em Campinas (e no Brasil, como um todo). Este foi apenas um dos pontos que citamos, mas que ela disse ser absurdamente necessário para um primeiro passo sobre um debate mais amplo e plural sobre direito à cidade e a cidade ser frequentada por uma mistura de públicos. Ela acredita que a cidade deveria ser feita por e para todo mundo. Carla Nathalia
- Thati e Larissa
Conheci a Thaty e a Lari no Parque Ibirapuera, em São Paulo, numa tarde de sábado. Estávamos andando, nos apresentando, quando a Lari disse: “Foi aqui que eu caí depois de beijar a Thaty pela primeira vez.” e eu perguntei “Mas caiu, caiu? Ou caiu, tropeçou?” e ela contou que caiu, mesmo, se ralou e teve que fazer curativos. Na hora, pensei: ok, quero muito ouvir essa história. Mas não vou começar por ela porque o começo se começa pelo começo, e, nesse caso, demorou um pouquinho até o beijo (e a queda no parque) acontecerem. A Thatiely e a Larissa trabalhavam juntas na TV Cultura, mas em horários diferentes. Elas se encontravam de vez em quando, a Thaty era estagiária de jornalismo e a Lari já estava lá há mais tempo. Na versão da Thaty, ela conta o quanto nunca tinha se visto numa relação com uma mulher porque vinha de uma cultura muito hétero (e especificamente “hétero top”), além de que naquele momento estava priorizando o estar-sozinha, por ter passado por um relacionamento bastante difícil do qual saiu bem machucada. O período que passou sozinha foi muito importante para aprender o que aprendeu e também para ver as coisas sob um novo olhar. Eis que, nesse meio tempo, ela encontrava a Larissa e sempre chamava atenção, por usar turbantes bonitos e brincos grandes, nas suas palavras: “É uma pessoa que chama atenção”, mas o olhar da Thaty para ela mesma, até então, não era o de ficar com uma mulher a ponto de ter um relacionamento… ou, pelo menos, ela não estava colocando nenhum rótulo na sexualidade - beijou mulheres em bares e foi entendendo o processo, se aceitando, afinal, foram 25 anos vivendo sob outro olhar e outra cultura, entender a bissexualidade era um tempo novo. Era janeiro e a Thaty trabalhou em um sábado - dia que ficavam pouquíssimas pessoas trabalhando, entre elas, a Larissa. Elas conversaram e surgiu o interesse, mas não sabia se era uma amizade ou uma paquera. Até que se adicionaram no Instagram, trocaram reações e quando chegou o carnaval elas tiveram a oportunidade de ir juntas num bloquinho com os amigos do trabalho. A Lari estava vivendo o momento dela sendo solteira no carnaval, ela conta que só se relacionou com mulheres na vida e foram poucas pessoas, então tinha recém saído de um relacionamento longo também, queria aproveitar o momento. A Thaty brinca que ficava não só observando, mas também se questionando, porque nunca tinha chego em ninguém. Na realidade heteronormativa em que ela estava inserida o costume era que os homens tomassem as iniciativas de chegarem até as mulheres, então ela não sabia como dar o primeiro passo com a Lari. Uma amiga até ofereceu ajuda, mas ela não quis, decidiu chegar lá e falar, mas na hora a Lari nem ouviu o que ela tinha pra dizer, as duas se beijaram logo. ♥ Porém, era um beijo de carnaval, né? No meio de um bloco acontecendo. Nesse mesmo dia elas beijaram outras pessoas - e por mais que a Lari em um momento tenha pego na mão da Thaty ela ainda brincou com um “Não me ilude, não!!”. Foi nessa hora que veio ele: o tombo. A Lari caiu porque estava muito bêbada e apostou corrida com uma amiga. Coisas de carnaval, né?! A Thati estava plena, disse que tinha um curativo e pediu pra eu escolher um machucado pra colocar, ou seja, eram vários. A Lari pedia: “Cuida de mim”, pra Thaty. E de alguma forma, deu certo o cuidado. Logo depois do carnaval a Thaty entrou de férias porque a melhor amiga dela estava tendo um neném e ela queria ajudar nos primeiros dias pós parto. Foram 15 dias sem ir trabalhar e, nesses dias, a Lari passou a trabalhar de manhã, no mesmo horário que ela trabalhava. Quando voltou das férias elas estavam sentadas numa mesa lado a lado, e por mais que isso inicialmente tenha despertado uma esperança, aos poucos foi fechando porque a Lari é uma pessoa bastante séria no trabalho. A Thaty justifica dizendo que a seriedade vem dela ser de capricórnio, porque leva o trabalho com muita lealdade, ficando muito fechada. Mas, como ela é mais tranquila, acabava conseguindo puxar alguns papos e distrair, então elas conversavam um pouco ali e continuavam a falar também pelo Instagram - além disso, todos os colegas incentivavam e apoiavam o casal que parecia surgir. Ainda sobre trabalhos, a Lari, no momento da documentação, possui 25 anos e é natural de São Paulo, ela trabalha como roteirista de audiodescrição, além de dar aulas de espanhol e fazer trabalhos com surdos e cegos. No cotidiano, também estuda para sua meta de vida, que é prestar mestrado em literatura (e, inclusive, dá aulas de literatura também em um cursinho pré-vestibular: o Maria Carolina de Jesus, que fica na capital). Já a Thaty, no momento da documentação estava com 26 anos, é natural de uma cidade chamada São José do Rio Preto, no interior de São Paulo. Thaty trabalha com marketing e experiência/expectativa do cliente em uma startup de alimentos e também dá aulas no cursinho pré-vestibular, porém de Redação. Atualmente, ela cursa Letras na Unifesp, mas já cursou jornalismo e odontologia em outros momentos. Por mais que ela acredite no poder da comunicação e usa muito isso nas suas aulas, não vê mais o jornalismo como uma profissão para si - pois entende que é muito difícil trabalhar com o jornalismo de fato. Sobre a odontologia, ela ainda pensa em voltar (e a Lari incentiva) - por mais que saiba do cansaço que envolve a rotina - acredita que é algo que vale a pena e que vai trazer muito orgulho à família também. Além disso, complementa que um dos motivos para voltar é que o conhecimento é algo que ninguém tira de nós. Foi com essa desculpa de muitos trabalhos e correrias que a Thaty resolveu pedir o Whatsapp da Lari para um projeto de audiodescrição. Por lá, durante a conversa, a Lari a convidou para o aniversário de um amigo em comum e novamente elas se encontraram, mas não ficaram juntas. Logo em seguida, a pandemia começou. E elas passaram todo esse momento inicial pandêmico conversando pelo Whatsapp e adaptando o trabalho para home office. Começaram com ligações à noite, o contato realmente aumentou até que a Lari foi até a casa da Thaty… e assim começaram uma relação que durava o período de se ver quinzenalmente. Até decidirem estar em um namoro, houve uma série de conversas sobre o que elas sentiam sobre isso, visto que a Thaty considerava que o período solteira após terminar uma relação era muito necessário para a pessoa se entender enquanto indivíduo, nos seus problemas íntimos. A Lari, por outro lado, queria viver de fato o romance, se entregar mais e se envolver. Rolou até aquela situação de confundir o ‘tchau’ com o ‘teamo’ e não entender o que está acontecendo de verdade entre elas. Mas foram se encaixando e conversando até chegar no ponto em que estaria tudo um pouco mais equilibrado… e então a Thaty foi apresentada para a família. Ao mesmo tempo que ser apresentada para a família da Lari era um ponto, para a Thaty, envolver a família, era outra questão. A família dela não fazia a menor existência da possibilidade dela se relacionar com uma mulher - e enquanto não acordassem que isso era um relacionamento, ela não sentia a necessidade de contar. Até o momento em que virou um namoro, e aí entenderam que esse passo deveria ser tomado. A primeira questão foi a mãe reagir como uma fase. Entendemos que é um processo familiar e que muitas pessoas passam por isso, que esse processo foi respeitoso sobre o que a filha sentia, mas que houve um certo afastamento - até certo ponto natural para o entendimento de cada uma com seus pensamentos. Contar para o pai que foi mais difícil, pois o passo teve que surgir de outra pessoa e a conversa não aconteceu de fato. Ela conta que, no fim, o processo não é tão doloroso por já não conviverem tanto presencialmente, já que mora em São Paulo há alguns anos. A única coisa que deseja - e luta - é por respeito, e por isso também respeita os processos familiares. Hoje em dia, a mãe dela já trata a Lari com bastante carinho, o que mostra que as coisas precisam de um tempo, e a mãe dela até brinca que as duas já estão se casando, com naturalidade. A família da Lari passou por outro processo, visto que é uma família que está mais próxima do relacionamento das duas e que sempre manteve a Lari muito perto. Desde mais nova eles sabem da sexualidade dela e não foi de uma forma fácil, pelo contrário: foi muito mais abrupta. Mas, também, foram processos. Ela falou algumas vezes na conversa a frase: “A educação me salvou.”, referindo-se à faculdade como um processo de libertação. No processo do relacionamento elas já passaram por muitas coisas, entre tentativas de morarem nos fundos da casa dos pais da Lari, até uma maturidade e um crescimento muito rápido das duas juntas nos primeiros meses de relação. Aprenderam a ter mais cuidado com os outros, não só em relação à empatia, mas em relação ao cuidado com quem se envolve, pois tinham suas energias rapidamente sugadas. Aprenderam a acreditar e ter mais fé na religião, no que está em volta e a serem mais elas por elas, juntas. Hoje em dia morar na mesma casa não significa casar. E casar, principalmente para a Thaty, tem um peso gigantesco. Ela sempre quis casar. Quis e idealizou a vida toda casar com um homem, naqueles moldes que conhecemos, mas hoje está feliz com uma mulher. “Eu quero casar com uma mulher. Quero fazer festa, convidar pessoas que gostamos. Quero viver esse momento, sempre sonhei com esse momento e quero viver isso com ela.” Elas falam sobre a naturalidade do relacionamento que possuem e que querem refletir isso no casamento, mesmo sendo socialmente tratadas diferentes, sabem que o amor que sentem é puro e natural. Por mais que existam idealizações no amor, a Thaty entende que tinha muita referência no amor que via em casa, entre os pais, pois eram muito cúmplices e amigos. Até hoje entende que o amor está na parceria e no cuidado, não nos grandes feitos: o amor é todo o dia. “O amor tá quando minha mãe manda o remédio pra Larissa quando ela tá gripada.” Hoje o relacionamento da Lari e da Thaty representa algo que elas conquistaram juntas, o melhor que elas puderam ser. Isso não quer dizer que não existam uma série de questões individuais próprias, de problemas a enfrentar ou de vida a acontecer, mas que o que era antes uma batalha solitária hoje em dia é uma força conjunta. A Lari conta sobre um livro do qual ela sentiu uma conexão muito forte, o “Amares”, do Eduardo Galeano, em que são crônicas sobre tudo que ele ama - e tudo que ele ama é literatura. Já estava tudo escrito de outros livros, ele só organizou. São várias esferas de amor. Ela fala, também, sobre o quanto encontrou o amor na religião e o quanto isso é importante para o entendimento dela enquanto pessoa: “Eu agradeço muito a Oxum e Oxalá que são os dois orixás que regem a cabeça dela (Thaty), pela vida dela e espero que muitas mulheres possam encontrar outro amor assim. Não só amor romântico, mas amor no geral porque eu acredito que o amor entre duas mulheres pode transformar a vida uma da outra porque tenho certeza que esse me transformou. Eu me sinto livre. Todos os dias eu quero fazer uma coisa nova e ela tá sempre me incentivando. Eu me sinto forte.”. Larissa Thatiely
- Ari e Ane
O encontro da Anelise, da Ariana e dos gêmeos Liz e Lucca com o Documentadas aconteceu num momento bem inicial da vida dos pequenos, antes mesmo de completarem 4 meses, num parque em São Paulo. Com entusiasmo, elas contam sobre como tem sido a vivência inicial da maternidade em dupla e como já ouviram diversas vezes as pessoas falando sobre os dois serem sortudos em ter duas mães. A partir do que vivem agora perceberam que qualquer mãe em um relacionamento heterossexual passa a ser uma mãe solo pelas necessidades básicas que enfrenta, muitas vezes sozinha/sem apoio para dividir intimidades - precisa fazer xixi, tem diversas questões com o corpo (a amamentação, o pós parto) - e como é diferente positivamente compartilhar isso com outra mulher na dupla maternidade, não é algo solitário. Também compartilham medos e situações inesperadas, como as primeiras noites, os choros e os momentos difíceis. Sabem que podem contar uma com a outra. Entendem que querem proporcionar coisas diferentes para as crianças, coisas que as famílias héteros talvez não precisem se preocupar porque não precisaram passar pelos desafios que passamos. Querem criar crianças conscientes. Ari comenta que viver a maternidade sem vincular à política é quase impossível, principalmente porque a fertilização de casais homoafetivos pelo SUS não é possível, o acolhimento do sistema único de saúde precisa melhorar, precisamos de representatividade, desde fisioterapia para a gestante até enfermeira que fale sobre amamentação. Ane completa que só está ali hoje porque brigou muito pela licença maternidade, mas que não deveria brigar, e sim ser lei, para então termos maneiras mais justas de vivenciarmos nossas formas de amor. Ane e Ari se conheceram em 2016. Ane sempre foi festeira, morava próximo à Av. Paulista e tinha uma vida agitada. Ari terminava a residência médica. No meio da semana, num feriado, Ane foi ao show da Preta Gil e Ane trabalhava no Hospital da Santa Casa, quando se cruzaram num aplicativo de relacionamento que funciona pela distância física (quando as pessoas passam uma pela outra em lugares próximos, elas aparecem no aplicativo). No dia seguinte, Ane acordou de ressaca e viu a Ariana no aplicativo. Deu um superlike, assim, apareceria logo que a Ari abrisse o app. Acabaram dando match - e afirmam que se não fosse essa “chamada de atenção”, provavelmente não teria rolado, já que Ari nem dava bola para os aplicativos (e nunca tinha saído com alguém assim). Decidiram sair, foram em um restaurante que não combinava nenhum pouco com elas, comeram salada e depois atravessaram a rua para ir num pub, que também não combinava com elas, mas ao menos tinha cerveja. Deu certo! Tudo fluiu e continuaram se encontrando aos poucos. Depois de dois meses, Ane estava com uma viagem agendada com um amigo para Cuba e chamou Ariana para ir. Ari recém tinha acabado a residência, estava querendo viajar e topou. Decidiram ir juntas e já entenderam que estavam se relacionando. Depois de um tempo de relacionamento, mas ainda no começo, Ane recebeu uma proposta de trabalho muito boa, porém que precisaria se mudar para Porto Alegre. Pensou muito, Ari apoiou, a encorajou, mas acharam que o relacionamento não iria durar pela distância. Ane acabou indo, morou lá por dois anos, e elas se encontravam aos finais de semana quando conseguiam, fazendo a ponte aérea POA X SP e usando uma manutenção diária para manter o relacionamento de todas as formas. Contam que não foi fácil, existia a saudade, a vontade de estar junto… Mas nesses momentos se usa todas as alternativas possíveis: se davam mais presentes, bilhetinhos, dedicatórias, chamadas de vídeos, aproveitavam 100% do tempo quando estavam juntas… Ari acrescenta que mesmo sendo pessoas diferentes, quando se conheceram, já se viam de formas completas. Isso auxiliou muito nesse processo. Já tinham suas profissões (e eram valorizadas), já valorizavam uma à outra, tinham suas redes familiares, seus amigos… Então tudo foi muito mais fluido, as cobranças quase não existiram. Depois dos dois anos em Porto Alegre, voltando à São Paulo, juntaram os animais de estimação, os móveis, a casa, e foram morar juntas. Anelise estava com 35 anos no momento da documentação. Ela é do interior de São Paulo, mas mora na capital há muitos anos e trabalha como advogada de empresas. Hoje em dia, o tempo livre é 100% ocupado pelos pequenos, mas também gosta de ir em rodas de samba, tocar violão e assistir filmes no cinema. Ariana estava com 38 anos no momento da documentação. É natural de São Paulo e trabalha enquanto médica pediatra. Conta que o tempo de agora é para fazer um conhecimento - conhecer os filhos e os filhos conhecer as mães. Nos primeiros momentos, o tempo era para fazer coisas básicas (comer, dormir, tomar banho…) e agora, com eles no carrinho, tem sido possível tomar café da manhã, por exemplo, o que é um grande prazer compartilhar esse momento com eles. Foi durante a pandemia que começaram a pensar sobre a maternidade, sobre quem iria engravidar e como seria. Tentaram uma vez e não deu certo. Depois, tentaram novamente, com aquela possibilidade - dois óvulos, podem ser gêmeos. Tinham medo pelas questões financeiras, mas encararam. Descobriram a gestação na semana da Parada LGBT de São Paulo, e agora, um ano depois, irão na Parada novamente - com eles no colo. Anelise conta que aprendeu com a Ari que o amor pode ser algo leve, com diálogo e respeito. Ela sempre foi muito afobada, atarefada… e hoje em dia é diferente. Não acha que só o amor sustenta relações, é preciso uma série de coisas, como respeito, carinho, atenção, um esforço orgânico, natural. Ambas entendem seus privilégios, mas entendem também que mesmo ocupando o local que ocupam ainda enfrentam diversas questões de preconceito por serem duas mulheres mães que se relacionam afetivamente. Por isso, aprenderam a enfrentar essas questões com o tempo. Falam também sobre como é importante a rede de apoio que possuem. Podem contar com os amigos, com a família, e isso facilita muito para a existência do privilégio de viver um amor leve. ↓ rolar para baixo ↓ Ariana Anelise
- Anne e Larissa
Foi trabalhando juntas que Anne e Larissa se conheceram, numa rede escolar, enquanto professoras de inglês. Trabalhavam em unidades distintas (ainda que em regiões próximas) e tinham uma amiga em comum, mas não se conheciam. Até que numa reunião entre equipes a Lari viu a Anne e se interessou, achou ela linda e decidiu falar com a amiga sobre. Se adicionaram no Instagram e aos poucos a amiga foi percebendo que realmente combinavam e decidiu ir criando uma ponte, instigando que uma fizesse contato com a outra. Até que aconteceu um evento na escola em que a Anne trabalha, em Campinas, e quando a Lari soube que precisavam de professores para participar do evento prontamente se disponibilizou. Trabalharam juntas o dia todo, no fim trocaram um “Nice to meet you” amigável, sem jeito… mas a verdade é que já estavam interessadas uma pela outra. Depois do dia de trabalho juntas, começaram a conversar de fato pelo Instagram demonstrando o interesse. Na versão da Anne, todo mundo no trabalho sabia o que estava acontecendo entre elas e colocava muita pressão, do tipo “Olha lá, a Larissa tá chegando!!”. Por isso ela até tentou puxar um papo, falar de uma tatuagem, mas não rendeu. Depois, quando começaram a conversar, o apoio foi imenso. Todos adoram elas juntas. Antes de assumirem o namoro, Anne teve Covid-19 e Lari acabou sendo a professora substituta dela na unidade escolar, então se falavam ainda mais. Contam como foi divertido também trocar nessa questão de trabalho, conversando sobre tudo - e nessa época Lari ficou mais próxima dos colegas de trabalho da Anne, descobrindo assim como ela é uma pessoa muito amiga de todos (e percebendo como eles também já sabiam da existência do romance delas). Não descartam o quanto estavam tensas por serem do mesmo trabalho (e por esse trabalho ser uma escola) ao assumir que estavam juntas. São profissionais, sabem das regras. No começo, concordaram que se não desse certo, Anne iria sair porque ela nunca teve a ambição de subir de cargo e trabalhar na coordenação (diferente da Lari, que sempre quis). No fim, Lari foi contar para a coordenadora. Contou enquanto também a convidava para ir ao seu aniversário e a reação não poderia ter sido melhor: Ela disse que já imaginava, tinha visto elas interagindo no Instagram, e tudo bem! Desde o primeiro momento entenderam que queriam construir um relacionamento juntas e isso ser aceito no ambiente de trabalho significou muito. Todos brincavam positivamente com elas, os colegas sempre quiseram ver o casal feliz. No momento da documentação, Larissa estava com 28 anos e segue enquanto professora de inglês - agora já está trabalhando parte do dia na coordenação. Além do trabalho, é muito ligada à família. Ama ficar em casa, com os gatinhos, dormir, tirar um tempo para fazer nada. Hoje em dia reside em Santa Bárbara d’Oeste, interior de São Paulo, mas nasceu em Americana e é lá que trabalha. Anne, no momento da documentação, estava com 33 anos. Nasceu na Bahia, numa cidade interiorana chamada Caetité, mas desde criança mora em Campinas. Segue trabalhando enquanto professora de inglês. Desde o começo o relacionamento vem representando uma série de mudanças para elas. Pela primeira vez, a Lari contou para os pais sobre a sua bissexualidade e Anne foi super bem recebida em casa, elas inclusive adoram esses momentos em família. Lari começou a gostar de futebol, assistir Star Wars e já tem até uma camiseta do Flamengo. Descobriu que é muito bom viver tudo isso ao lado da Anne porque como são coisas que ela ama, enxerga com muito brilho no olhar. Anne veio de uma família bastante religiosa e conservadora, então o assunto de se relacionar com uma mulher é muito mais delicado. Lari foi a única pessoa que ela resolveu dizer: “Estou namorando e quero trazer ela aqui em casa”. A primeira vez que contou para os pais sobre a sua sexualidade foi há anos atrás, mas não teve boa aceitação e desde então viveu como um silêncio. Um hiato enorme, uma agressão disfarçada porque não aceita quem ela é. Hoje em dia, depois de ter assumido novamente - dessa vez com a Lari - sentiu uma vontade de quebrar preconceitos vindo do pai, que se mostrou muito mais aberto a entender. Atualmente a Lari frequenta sua casa e elas sentem que tudo evolui aos poucos, mesmo não sendo fácil. Para o relacionamento dar certo, entendem que precisam respeitar seus tempos. Lari tem uma postura mais combativa nos momentos de desafio, enquanto Anne prefere ficar em silêncio, processando, mesmo que tendo companhia. Lari explica que é um aprendizado acompanhar a Anne nos seus processos e que nunca abrem mão da comunicação. Comunicam tudo, o tempo todo, desde coisas básicas (como o que querem fazer juntas) até conversas intensas sobre o que sentem. Pela primeira vez, Anne enxerga o relacionamento enquanto paz. Sente que em outras vezes que se relacionou, não só amorosamente, precisou fazer muito esforço para ser ela mesma, se sentir bem. Com a Lari não existe dificuldade para a paz existir. E amar também é isso, se sentir bem sem querer mudar o outro e nem se mudar para agradar. Uma grande compreensão de como somos, não de forma descartável, mas de ter tolerância. Lari completa dizendo que sente um amor que gostaria que todos vivenciassem. Lembra de um momento que o pai dela viu elas desenhando juntas e disse “Como vocês combinam, né?!”. Sempre teve sua referência de amor baseada na família e acredita que a Anne já atingiu isso: se tornou família pra ela, o amor que sempre acreditou. Um núcleo, algo muito mais íntimo. ↓ rolar para baixo ↓ Anne Larissa
- Rachel e Larissa | Documentadas
Quando fui até Cotia visitar a casa em que Rachel e Larissa moram com a pequena Maria Eugênia e as cinco cachorras mais simpáticas possíveis, não esperava encontrar uma família tão linda e parceira. Lari explica que esse amor tão claro que se enxerga logo que chega é atraído por diversos movimentos, elas nunca ficam paradas: estão sempre falando, ouvindo, dispostas e principalmente não se julgando. Na maternidade entenderam como o não julgamento é importante. Cada uma traz a sua referência de amor e de educação, então precisam entender juntas como criar alguém. Além disso, passaram a perceber a maternidade como uma grande espera: antes, esperavam os exames, depois, um bebê por 9 meses, agora tudo é no tempo da Maria Eugênia. Vivemos numa sociedade muito imediatista que quando você entrega algo e o resultado não sai na hora você se sente frustrado… o tempo de um bebê é muito diferente, o relógio deixa de fazer tanto sentido, e assim elas estão observando muitas coisas diferentes na forma de se relacionar com a vida também. Sentem que o começo do relacionamento era muito sexual, com cheiros, sensações, toques; Depois passaram por um momento de centralizar, entender o que desejavam para a vida, repensar; Depois viveram o planejar, construir a vida… E agora esse amor de doação, de paciência. Logo que Maria Eugênia nasceu, elas pediram para um veterinário vir até a casa para entender como seria o convívio com os animais. Depois de um tempo ele disse: “Nossa, aqui é muito diferente. São 5 cachorras que convivem muito bem, fêmeas, vocês são duas mulheres com um bebê e aqui não tem barulho, é silêncio”. E adoram viver assim, em harmonia. Rachel, no momento da documentação, estava com 38 anos. É psicocardiologista, identifica síndromes e transtornos psicológicos que acometem o músculo do coração e trabalha tanto na área clínica quanto dando supervisões. Nasceu em Itu, no interior de São Paulo, e atualmente mora em Cotia. Larissa, no momento da documentação, estava com 27 anos. É pedagoga mas não atua na área. Trabalhou em uma empresa própria produzindo e vendendo produtos para pets durante 7 anos, desde que elas adotaram a primeira cachorra, que por ser pequena pouco achavam produtos para ela. Hoje em dia, Lari se dedica à maternidade e registra bastante isso em suas redes sociais, fazendo disso uma fonte de renda alternativa. Para Lari, o namoro - que começou quando ela tinha 19 anos - foi uma descoberta sobre possibilidades de famílias. Um grande acolhimento. Quando ela conheceu a família da Rachel, pensou: “Meu Deus, dá para ser amada assim? Dá para viver isso? É assim que um apoia o outro?” E hoje em dia ela segue enxergando o amor, a família e as possibilidades de amar como grandes descobertas - ela traz o exemplo das cachorras, todas são resgatadas e algumas viveram os maus tratos, como a Vibe (golden retriever) - a primeira vez que elas demonstram felicidade, mexem o rabo, é uma descoberta, é ver o amor acontecendo, é entender que sim, dá para ser amada assim. Rachel conta sobre uma cirurgia muito delicada que precisou fazer e que passou por muitos cuidados, desde ajuda para escovar os dentes, tomar banho, até cuidar dos curativos e processos mais dolorosos… e Lari tem muito medo de agulha, sangue, cicatriz, mas mesmo assim cuidou e não saiu do lado dela. Essa parceria que possuem e que sabem que podem contar é algo muito valioso que entende como único. Foi em dezembro de 2015, literalmente depois do Natal - dia 25 - assim que a ceia acabou, que se conheceram. Era uma festa LGBT em Campinas, estavam lá para passar o natal com seus respectivos familiares e souberam da festa por amigos, separadamente. Se esbarraram na festa porque a Rachel interagiu com o amigo da Lari sobre ele ter um piercing no mamilo, já estava bêbada e a Lari interagiu com eles, mas na hora ela não retribuiu a interação, achou um pouco estranho. No final da festa, a DJ, que era quem convidou a Rachel, questionou que ela veio para a festa mas não beijou ninguém e ela explicou que até tinha sentido atração por “aquela menina” (a Lari) mas que “com certeza ela era hétero”.. A DJ não acreditou e disse para ela ir logo tentar o beijo, então ela foi, cutucou a Lari pelas costas e disse: “Vim aqui te dar um beijo!”. O beijo foi horrível, ela foi embora para Itu logo depois, o dia já estava claro… Até que no dia seguinte recebeu uma mensagem da Lari dizendo: “Chega, me beija e não pergunta nem meu nome”. O celular da Rachel a Lari conseguiu porque ela passou para o amigo, quando se conheceram momentos antes. Ela respondeu: “Tem razão, qual seu nome e idade?” “Larissa, 19 anos.” Rachel gritou: “Puta que pariu! Eu escapei da pedofilia por um suspiro!” Ela tinha 30. A mãe da Rachel entrou no quarto com o grito e perguntou o que houve, quando ela respondeu que ‘ficou com uma novinha ontem’ e foi questionada a idade, a mãe respondeu: “Ah, Rachel, pelo amor de Deus… Com 19 anos todo mundo já sabe muito bem o que faz!”. Rachel diz, rindo, que daquela festa a Larissa já saiu namorando. E Lari responde: “É, ué.” Na época, Rachel morava em São Paulo e Lari em Sumaré, no interior, onde ocupava seu tempo fazendo diversos tipo de artes entre tecido, jazz, balé, teatro… Rachel era totalmente o contrário, vivia em pesquisas científicas, vida acadêmica, coisas mais quadradas, estava em crise de idade e ficava pensando que Lari iria entrar na graduação enquanto ela já seria professora universitária. Para Lari, elas já estavam juntas no período que se conheciam/ficavam em 2016. Passavam bastante tempo juntas, viajavam, mas não rotularam enquanto um namoro porque era bem difícil para a Rachel, ela se sentia blindada. Até que elas decidiram morar juntas, no final de 2016, quando iriam completar um ano do dia em que se conheceram, e adotaram a primeira cachorrinha - assim teriam mais um motivo para estar em casa. Depois disso, Lari começou a graduação e a vida foi ficando mais leve. Adotaram mais uma das cachorras pequenas, viajavam bastante e cada uma foi adaptando sua rotina e seus trabalhos. Até que em 2017 começaram a loja com os produtos de pets, depois adotaram as cachorras maiores. Pontuaram algumas vezes o fato de que no começo poucas pessoas apoiaram o namoro, a maioria achava que era algo transitório por conta da idade e principalmente por serem de universos muito diferentes. Lari ensinou uma leveza para a Rachel que ela nunca havia tido contato, ela sente que deixou de ser quadrada. Tiveram muita torcida contra, mas seguiram juntas e acreditam que é essa persistência que fez a vida valer a pena. Desde que se conheceram, Larissa falava sobre o desejo de gestar e maternar, não parecia ser uma fase, mas esperaram isso amadurecer. Em 2019 começaram o movimento de fato, fizeram terapia juntas para entender como seria (visto que Rachel não sentia o desejo de gestar, pensava muito na adoção) mas precisavam também ter um planejamento: ter uma casa e um preparo de vida para a chegada da Maria Eugênia. Compraram a casa em 2020, tiveram muitos desafios com empreiteiras, foi um desgaste bem grande, demorou mais de um ano depois da mudança para conseguir seguir com o planejamento da gravidez. Em 2022 fizeram buscas por médicos, mas não se sentiram seguras, então deixaram passar novamente. A sensação era de que o quarto era uma tela em branco, sempre esteve ali, mas pouco falavam sobre. No final de 2022, Rachel teve um problema de saúde bem grave e decidiu congelar óvulos, mas quando procurou o procedimento eles aconselharam a não fazê-lo porque as chances de não darem certo eram muito grandes. Foi ali que decidiram: vamos investir agora. Ela passou por três equipes nesse processo, infelizmente a experiência com as duas primeiras não foram boas, ela sofreu violência obstétrica, pediu para que mudasse para uma equipe de mulheres e conseguiu, já haviam comprado o material biológico masculino e foi enviado para o novo local. Em abril de 2023 fizeram a primeira transferência embrionária, deu tudo certo, ouviram o coraçãozinho, passaram o primeiro dia das mães juntas, acompanharam o desenvolvimento por 7 semanas até que não teve mais evolução na gestação, não tinha mais batimento cardíaco. Clinicamente, foram mais de 45 dias para começar tudo novamente (preparar o corpo para uma nova gravidez), mas além disso é preciso considerar o quanto elas estavam muito abaladas por essa série de coisas que sofreram em meses. A segunda tentativa foi em julho, e deu certo novamente, a Maria Eugênia veio ai. Hoje em dia, se colocam como mães antes mesmo de qualquer comentário chegar. É quase como um escudo, uma blindagem, já se preparam. Já ouviram diversas perguntas, comentários, coisas sobre a Rachel ser avó da Maria Eugênia, mãe ou irmã da Larissa. E nesse ponto falamos muito sobre como as pessoas se acham livres para fazer comentários sobre os nossos corpos ou sobre o não-reconhecimento delas enquanto um casal e, sobretudo, uma família. Encontram qualquer via, desculpa, para não reconhecer essa unidade familiar. Então o escudo vem para evitar desgaste: já se colocam como mães, Maria Eugênia é filha delas, deixam claro que a família existe antes de qualquer coisa, em todos os lugares que chegam. ↓ rolar para baixo ↓ Rachel Larissa
- Jade e Laura | Documentadas
Jade, no momento da documentação, estava com 27 anos. É natural de São Paulo, da zona leste, mas hoje em dia mora próximo à USP para ficar perto da faculdade, da Laura e para economizar o tempo diário que levava no transporte público. Ela é jornalista, cursa mestrado e trabalha enquanto assessora de comunicação. Conta que passa o dia fora, trabalhando de forma presencial e tem uma rotina bastante atarefada. Na pandemia de Covid-19, trabalhava em casa e era bem diferente, então agora ela e Laura readaptam o cotidiano para aproveitar o novo lar e passar o maior tempo possível com a Marininha, gatinha de estimação - chegam em casa, tomam café juntas, conversam sobre o dia, assistem TV, aos finais de semana leem e Jade tenta praticar yoga. Laura, no momento da documentação, estava com 26 anos. É natural de Aragarças, em Goiás. Morou em Minas Gerais, numa cidade interiorana, onde começou a cursar publicidade, mas achou um pouco frustrante porque não tinha muitas oportunidades lá, até que conheceu uma professora que contou para ela sobre o curso de Educomunicação na USP e ela tentou a transferência, em 2019. Hoje em dia, ela trabalha com mídias sociais, numa rotina semelhante à Jade, a diferença é que tenta ir de bicicleta para fugir do transporte público, conta rindo. Ama assistir filmes, está cursando uma pós-graduação em audiovisual e gosta de passar tempo de qualidade em casa. Para elas, o amor é estar num lugar de segurança. Quando falam sobre isso, Jade lembra de uma situação que viveu em que foi assaltada e que a primeira pessoa que pensou em ligar/precisar falar foi a Laura, e que depois disso caiu a ficha: significa que ela é seu porto seguro. O amor significa uma ajuda diária, o ponto que deseja evolução, de querer ver crescer - e estar do lado nesse crescimento. Laura pontua que viveu cercada de muito machismo e que sempre faz de tudo para ver o dia delas sendo bom em conjunto: sempre cuidam da casa, dividem as tarefas, fazem questão de que as coisas não fiquem pesadas pra ninguém, deixam tudo confortável, cuidadoso, sabem que se não for assim, vai ficar pesado para uma pessoa só. Querem o espaço equilibrado e verdadeiramente seguro para o amor existir. Foi em 2019 que se conheceram, quando a Laura se mudou para São Paulo e começou o curso na USP. Jade também estava no curso, de início surgiu o interesse, mas ambas eram tímidas e não sabiam como demonstrar. Haviam amigos em comum, eventos, coletivos, então tentaram aproveitar essas brechas. Foi num dia em que Laura estava numa reunião do coletivo LGBT+ que viu Jade e pensou “Bom, ao menos bissexual ela é!” que a esperança começou a surgir. Pelo lado de Jade, ela viu uma publicação num grupo de Facebook em que os novos estudantes se apresentavam e falavam coisas básicas como nome, idade, signo, orientação sexual, se estava solteiro… e a Laura comentou. Ali ela já soube o que interessava. Entre maio e junho começaram a conversar e interagir mais, foram até no cinema assistir Toy Story, mas nada aconteceu. Até que surgiu um jantar na casa de um amigo - que até hoje acreditam ter sido uma marmelada, porque os amigos marcaram, mas ninguém deu as caras! - e só elas foram. Beberam muito, ouviram música, o anfitrião foi dormir e deixou elas na sala, se divertindo, até que demonstraram que tinham interesse uma na outra. Depois do primeiro beijo, ficaram juntas por alguns meses, mas Laura tinha acabado de se mudar e estava confusa com tudo ainda, conhecendo a cidade, não queria um relacionamento sério. Sentia que sua vida no interior era muito diferente do que experimentava na capital. Logo que optaram por não ter um relacionamento, a pandemia de Covid-19 começou, ela decidiu voltar para Goiás com a gata (Marininha) pelo fato das aulas terem parado e não ter motivos para continuar em São Paulo. Ficou um ano lá, mantiveram bastante contato online e contam que parecia até um web namoro. Em junho de 2021, as aulas estavam retomando e Laura decidiu voltar a morar em São Paulo. Chegou querendo muito reencontrar Jade, obviamente. Sentem que a vida estava muito estranha, era tudo bem diferente de 2019/2020. Primeiro que não existia mais aquela sensação de mudança/recém chegada na capital, segundo que a vida em si estava estranha, muitas pessoas morrendo, uma sensação de fim-de-mundo, e terceiro que elas estavam financeiramente estáveis, tinham seus trabalhos (diferente de 2019), o sentimento era outro - e estavam mais maduras para a sensação de querer estarem juntas, pensarem sobre um namoro. Se estabilizou na cidade novamente e em setembro começaram, de fato, a namorar. Jade tinha muito medo de pegar Covid, morava com a família e pegava transporte público diariamente, tinha medo de colocá-los em risco. Então decidiu procurar um lugar para morar próximo à Laura e à faculdade. Primeiro, moraram próximas mas em prédios separados. Depois, moraram no mesmo apartamento, mas em quartos separados, dividindo com outras pessoas. E agora, finalmente, conquistaram seu próprio lar, um lugar com a cara delas em todos os detalhes da decoração e muito espaço para a Marina ficar à vontade. No dia da documentação, inclusive, iria rolar um “chá de casa nova”, uma celebração para os familiares comemorarem a conquista e presentearem com ítens para a casa. Elas confessam que estavam bem ansiosas pelos presentes, queriam muito saber se iriam ganhar um aspirador (e ganharam! hahaha). Fazer a documentação nesse momento foi importante, também, porque a mudança em si foi muito caótica e viver momentos assim causam um certo apagão sob as coisas boas que vivemos, o caos se instaura e ficamos submersos até passar, então foi uma conversa importante para relembrar o trajeto até ali e ver os detalhes da casa sendo construídos. Por fim, em março a Jade pediu a Laura em casamento - e conta que está esperando o pedido de volta, porque para elas tudo acontece de forma igual. ↓ rolar para baixo ↓ Jade Laura
- Vanessa e Denise
Durante a documentação sobre quem a Vanessa e a Denise são, elas falaram algo que marcou muito: “Somou de contextos muito diferentes, mas temos sonhos muito semelhantes”. A Vanessa estava com 24 anos quando nos encontramos, ela é de São Bernardo, cidade que pertence à São Paulo e ela apelida como ‘batateira’, pois é a terra da plantação de batata. Sua formação foi em direito e sempre trabalhou na empresa da família, o que não era uma escolha muito pessoal, mas comenta o quanto se sente amedrontada por ver suas colegas negras que se formaram ainda na busca por emprego e o quanto o mercado de trabalho está difícil pela desvalorização da profissão como um todo. A Denise estava com 25 anos quando nos encontramos, ela é de São Paulo, capital, mas sua família é da Bahia e sua mãe se mudou para o sudeste quando estava grávida. Há pouco tempo ela deixou para trás a administração e apostou na mudança de carreira, se tornou programadora e está sendo desenvolvedora web. Dentro da empresa, já trabalhou em alguns projetos de diversidade e inclusão, com questões raciais e LGBTs. Além disso, no seu tempo livre, adora fazer crochet, mandalas de lã e artesanatos. Quando a Vanessa e a Denise se conheceram, demorou um pouco para as coisas acontecerem. A Vanessa brinca que estava no momento de “piriguetear”, porque teve um relacionamento que durou três anos e que agora era o momento de baixar aplicativos, conhecer gente nova, sair e se divertir. Ela também fala da importância da conclusão que chegou em que só se relacionaria com outra mulher negra, porque percebeu traços abusivos e racistas no antigo relacionamento e não queria vivenciar esse tipo de trato novamente. Foi em 2017 que as duas deram ‘match’ num aplicativo de relacionamento e a Denise chamou a Vanessa para uma festa, a “Sarrada no Brejo” (pelo nome, obviamente, uma festa sapatão). Ela nunca tinha ido e topou, então se encontraram no metrô e conta que quando a viu com o cabelão logo pensou “Nossa, que mulher maravilhosa!”. Algumas amigas da Denise foram junto e a Vanessa foi sozinha, brinca que as amigas de cara odiaram ela, porque ela tem uma “cara meio marrenta e nada amigável”. Na festa elas dançaram, se beijaram, mas Denise também beijou outras pessoas, foi tudo meio caótico. Elas brincam que não se gostaram logo de início, tudo levou tempo. Na mesma semana da festa, ou melhor, do primeiro encontro, elas viram que iria ter um show da Ana Carolina com a Maria Gadú e resolveram ir. Mas, detalhe: o show aconteceria só dois meses depois. Compraram o ingresso mesmo assim. Nesse intervalo não saíram mais e pouco se falaram. No show, não ficaram. Estavam como amigas e a Vanessa até levou a Denise para dormir na casa dela - algo bem raro, porque nem amiga dorme lá - mas nada aconteceu. Ficaram alguns meses sem se ver ou se falar e, do nada, cerca de 4 meses depois, se reencontraram. Com esse reencontro, o encontro delas finalmente aconteceu. Encontro, no sentido de, ficarem juntas. Elas começaram a sair de verdade, se conhecer, querer se encontrar. Se viam todos os finais de semana, compartilhavam amizades, faziam programas bons e ruins, se divertiam e topavam conhecer vários lugares. Quando entenderem que estavam gostando uma da outra, foram passar o ano novo juntas com alguns amigos, em Santos, e foi lá que o pedido de namoro aconteceu. Alguns meses depois a Vanessa apresentou a Denise para a família dela e, logo depois, ela também caiu (literalmente) no dia que foi apresentada para a família da Denise (como isso é bem peculiar, a gente precisa registrar por aqui). Depois de estarem se relacionando, a Denise passou por um momento bem difícil no qual saiu da empresa que trabalhava por estar passando por situações de preconceito e por não estar mais conseguindo se desenvolver. Isso desencadeou em crises de ansiedade e depressão, e foi fundamental o apoio da Vanessa e todo o suporte que ela deu. Quando a Denise conseguiu se desvincular do trabalho e receber seus direitos, elas juntaram as finanças e decidiram ir para a Nova Zelândia. Denise conta como era um sonho fazer uma viagem internacional, por ser a primeira da sua família a se formar no Ensino Superior, viajar ao exterior era algo praticamente impensável, mas ela queria fazer novamente algo que ninguém tinha feito antes. A Vanessa se incluiu nesse sonho, fez a pesquisa dos valores e disse: “A gente consegue!”. Por mais que a Vanessa e a Denise se encontrem em muitos caminhos, a vivência delas ainda era muito diferente: a Vanessa morava em uma mansão e a Denise morava na frente de um córrego, numa rua que não era asfaltada. Isso sempre trouxe recortes de classe muito fortes. No início foi muito difícil fazer o encaixe, mas aos poucos entenderam que era possível uma ensinar para a outra o que aprendeu com a vida. A Vanessa mostrava o caminho para chegar aos sonhos, mostrava uma nova realidade também, era uma outra forma de falar, outros costumes… Enquanto a Denise mostrava correrias diárias, mostrava que não entrava em casa como as da Vanessa a não ser para limpar, junto com a mãe dela, que a visão que ela tinha das coisas era diferente e que também precisava-se de calma para viver entre os dois mundos. Só com muita conversa diária elas foram se entendendo e aprendendo uma com a outra. A viagem para a Nova Zelândia aconteceu, e elas brincam: “Ou a gente volta casada ou a gente se separa de vez”. E foi acontecendo. Hoje em dia, a demonstração de afeto delas chega através das brincadeiras, das zoações, dos pequenos (grandes) carinhos e da parceria para tudo. Elas não foram crianças que conviveram com grandes afetos físicos demonstrados o tempo todo, então o afeto que sentem uma pela outra é colocado de outra forma, de uma forma que se combina e se entende. Hoje em dia, elas se entendem enquanto um casal que tem muita consciência. Se amam e querem se amar cada vez mais, e em relação aos outros - ou à vida, em sociedade - nunca mais irão deixar que alguém as coloquem para baixo. A Denise diz: “Acho que a nova geração tá vivendo uma coisa que não tivemos na nossa infância. A gente cresceu com aquela ideia de que ‘’preto é feio’’ ‘’seu cabelo é feio’’ ‘’sua pele é feia’’. Quando comecei a trabalhar num ambiente branco eu escutava que era nojenta, que não deveria trabalhar ali, que deveria trabalhar isolada porque eu incomodava. Eu não tive o suporte que ela teria porque a família dela tinha mais acesso, seria uma discussão diferente. Eu chegava muito abalada em casa e escutava ‘’filha, é isso, o mundo é esse e você se vira. Você precisa colocar comida em casa, então te vira’’.” Mas não é pela Vanessa estar num ambiente elitista que ela deixou de sofrer racismo, então ela também completa com a sua versão: “No meu caso foi o seguinte: uma das piores coisas que aconteceu comigo - fui numa balada, festa da minha faculdade. Um colega de classe sabia que eu me relacionava com mulheres e ele me agrediu. Estava bem no fim do ano, em época de prova. Meu pai todos os dias ia pra faculdade comigo, entrava na faculdade, sentava do meu lado, esperava eu terminar a prova pra ir embora comigo. No final, eu tive que mudar de horário, porque o branco, enfim, né…”. Depois de relatar sobre alguns casos de racismo vividos, Vanessa emenda logo no amor que as duas sentem: “Pra mim o amor é: liberdade e preto”. Liberdade porque o amor precisa ser livre para deixar a pessoa ser quem ela é e, também, para que a pessoa possa fazer o seu caminho. E Preto porque ela levou muito tempo para se amar enquanto mulher preta, e conta que depois que descobriu esse amor passou a amar muito mais seus familiares, amigos e a Denise de uma forma diferente. O amor preto não é só amar ao próximo, mas cuidar dos seus, estar por perto de verdade. Amar o que sempre foi ensinado que era feio. A Denise conta sobre a tatuagem “Idem”: “Então, eu tenho o meu Idem, minha tatuagem, o termo Idem eu sempre usei pra falar sobre reciprocidade. Acredito muito nisso em todas as minhas relações, sou uma pessoa de poucas relações afetivas. Penso no amor como algo recíproco, esse bem estar que você gera no próximo e que também quer gerar a si. Claro que as pessoas têm diferentes níveis, amores e reciprocidade. Me relacionar com uma mulher é exatamente isso, me reconhecer na outra, o que tem de mim na outra e o que tem na outra em mim.” Ela conta que nunca pensou que iria receber um amor afetivo até amar uma mulher. Amar uma mulher é ser reconhecida, respeitada e saber que tem alguém para te acolher. “Penso que amor também é sobre me sentir acolhida por amar uma mulher.” A Vanessa e a Denise entendem que é impossível se relacionar sem fazer o recorte de raça, classe e gênero. O amor preto é revolucionário, o amor entre mulheres é revolucionário. Por todas as dores que elas já passaram juntas e por nenhum momento mais que querem ser invizibilizadas, querem ter seu amor e seu corpo reconhecido, respeitado e humanizado. Vanessa Denise
- Leticia e Giovanna
Acredito que a história da Letícia e da Giovanna fala muito sobre a forma que elas lidam com as coisas felizes e, sobretudo, difíceis. Não é nenhum pouco fácil ter uma história que já tenha passado por tantos desafios como a delas e seguir com tanta fé no sentimento que vivem, na relação que constroem e no que sentem uma pela outra, ainda mais sendo algo que ainda não passou por completo: vivem uma rotina delicada diariamente. Claro, a cada mês que passa conseguem enxergar o quanto evoluem juntas, mas é algo que vivenciam, e não que já passou por completo. Essa dificuldade girou sempre em torno da não aceitação do namoro por parte de uma das famílias. Como elas se conhecem desde a infância e moram na mesma rua, Letícia há alguns anos já era bastante próxima, frequentava a casa da Giovana e criou um laço de amizade forte com a mãe da Giovana, foi auxílio para a família em diversos momentos difíceis, era amada por todas e tratada como uma filha postiça. A mãe algumas vezes questionou, tinha um receio de que as duas se envolvessem, mas como ainda era um momento inicial de descoberta para elas e tinham medo da reação, negavam. Num dia, Giovanna decidiu contar a verdade, até que tudo saiu do controle. Infelizmente, vivenciaram situações difíceis de não aceitação e desrespeito. Foram meses sendo ignorada pelo pai dentro de casa, o que deixou Giovana muito triste e culpada. Não ter mais ele como um amigo, ela deixar de ser a filha idealizada, tudo machucava muito. Foi preciso muito tempo - e muita paciência das duas para as coisas mudarem aos poucos. Com isso e com a insistência eles foram entendendo o relacionamento delas (e até incluindo a Letícia em alguns dos planos e eventos que aconteciam). Mas tudo ainda é um processo. Letícia, no momento da documentação, estava com 24 anos. Ela é de São Paulo, capital, e trabalha enquanto biomédica, intercalando entre o trabalho em laboratório e a sala de aula; No tempo livre, adora jogar vôlei. Giovana, no momento da documentação, estava com 22 anos. Também é de São Paulo e está se formando em veterinária, trabalha no estágio e faz plantões aos finais de semana; Adora cuidar do corpo, já praticou lutas e hoje em dia ocupa parte do seu dia na academia. Elas estão juntas sempre que podem. Adoram tudo o que é relacionado à natureza. Gostam de cachoeiras, de jardins. Na cidade, adoram coisas simples como ir ao supermercado, passear em lojas. Brincam que até comprar pão de queijo vira um grande evento. Letícia conta que sua cultura familiar é bem diferente, entende que por lá as coisas sempre foram mais fáceis. Já tinha outros LGBTs na família e quando viveu seu processo contou para a irmã primeiro. Por mais que nenhuma vivência inicial seja fácil, entende que a dela não tenha sido tão difícil porque houve maior respeito. Porém, ter sua cultura mais libertadora, faz com que seja mais difícil aceitar alguns limites que foram impostos para a Giovanna e ter mais vontade do imediatismo. Foi preciso aprender a ser mais paciente do que imaginava. Como estudaram na mesma escola e moravam na mesma rua, Giovanna e Letícia se conheceram desde muito novas. Letícia, por ser alguns anos mais velha, era amiga do irmão da Giovanna. Não se falavam muito porque, segundo a Gi, Letícia tinha cara de brava… mas, depois de adolescentes, Letícia se apaixonou por uma amiga da Gi e isso fez com que se aproximassem e ficaram amigas. Em outubro de 2018, bom tempo depois, Giovanna entendeu que sentia algum tipo de atração pela Letícia e resolveu se abrir com ela. Enviou um texto gigante explicando o que sentia… e ela… sumiu. Letícia conta que chegou a responder, mas que ficou em choque, não sabia como reagir e se sentiu muito insegura. Meses depois, em janeiro, respondeu com outro texto. Elas conversaram e a Letícia a convidou para ir num casamento, como acompanhante. Neste dia, depois da festa, se beijaram pela primeira vez. Porém, sentiram que o beijo não encaixou e fingiram que nada tinha acontecido, seguiram amigas. Com a amizade voltando, se encontravam todos os finais de semana. Até que se beijaram outras vezes, e outras, outras… tornou-se frequente. Foram 6 meses de encontros. Nesses meses, Giovanna se dizia hétero, mas estava ficando com a Letícia. Depois, até entender e processar, no seu tempo, começaram de fato a namorar. Quando a família da Giovanna descobriu sobre o namoro e tudo ficou muito difícil, ela estava no começo do estágio e foi bastante acolhida pela chefe. Conta também que foi muito importante tudo isso não ter acontecido durante a pandemia (e sim antes) porque seria tudo mais difícil, como um cárcere privado. Ela vivia entre regras muito rígidas de horários para chegar, satisfações para dar, colocavam uma culpa muito grande em cima dela e também da amizade que a Letícia tinha com a mãe dela. Prometiam dar carro de presente se elas terminassem ou coisas do tipo. Mantiveram o namoro marcando encontros em lugares aleatórios e pensaram em desistir várias vezes, mas seguiram juntas em todos os momentos. Aos poucos, a família toda da Giovanna foi aceitando (para além dos pais). Em um evento importante, por exemplo, foram todos juntos de carro. Com o passar do tempo, a Letícia conseguiu até abraçar o pai dela (coisa que nunca imaginaria no início), foi realmente um processo, por mais que não se falem muito, reconhecem o grande avanço. Na pandemia em si, mesmo a Letícia não podendo estar dentro da casa da Gi, ela ia até o portão, fazia de tudo para se mostrar uma pessoa presente, fazia as compras do mercado para eles e eles foram reconhecendo seu esforço. Por um tempo, a mãe da Giovanna precisou de cuidados de saúde e foi a Letícia quem ajudou, trazendo também uma amiga enfermeira para dentro de casa. Acreditam que mesmo com as situações ainda difíceis - porque nem tudo passou - continuam aqui e não desistem porque cada vez mais falta menos para a Giovanna se formar e conquistarem tudo o que sonham: principalmente, a independência. Letícia acredita que amar é a essência do ser humano e que mesmo as pessoas não sendo carinhosas, elas podem demonstrar o amor de outras formas. Traz sua mãe como exemplo, que não demonstra tanto amor nos atos de carinho em si, mas que sempre a ensinou a amar. Diferente da mãe, ela ama beijar, abraçar e demonstrar. Se vê totalmente disposta a ajudar. Giovanna sente que pelas marcas da vida passou muito tempo se blindando de sentir coisas, não se permitindo demonstrar afeto. Aos poucos, tem se permitido cuidar mais, sentir mais o toque, mas ainda mantém o pé no chão, cuida de quem se permite confiar. Por fim, verbalizam o quanto desejam ficar juntas, construir uma família e viver coisas juntas. E concluímos: merecem tudo isso. ♥ ↓ rolar para baixo ↓ Letícia Giovanna
- Tania e Clarissa
Queria contar a história da Tânia e da Clarissa (e do Gael, claro) de uma forma que tudo se completasse, porque a vida delas acontece assim. Diversas vezes, desde que nos encontramos em São Paulo - cidade em que elas nasceram e moram com o Gael - falamos no sentimento que existe sobre a vida tê-las preparado para a chegada dele. E isso não significa que ter um filho e educar uma criança de forma inclusiva é tarefa fácil ou, que nesse caso, venha com receita pronta, mas que elas estavam de braços abertos e muito dispostas para receber tudo o que aprendem e compartilham diariamente. A forma de começar a contar essa história vai ser pelas fotos porque escolhemos fazê-las num local muito especial, um café, localizado no bairro da Mooca. Esse café foi a Tânia quem pintou, com giz de cera, cada uma das paredes. Quando ela pintou, não imaginava que adotaria o Gael, mas já estava com o processo de adoção bastante avançado no fórum e tinha feito uns murais na escola em que trabalhava, quando o dono do café foi matricular a filha, os viu e decidiu contratá-la; foram dez dias de muitos desenhos nas paredes… mas um desenho em especial, de frente para a cozinha, era o preferido do casal (e também da Tânia!): uma menina no balanço, lendo um livro. Enquanto pintava, Tânia resolveu perguntar o motivo deles terem gostado tanto do desenho e a resposta foi que remetia à uma criança com síndrome de down (a esposa do dono do café é fisioterapeuta e tem essa especialização). A menina, com seus dedinhos curtos, segurando o livro, de olhinho puxado… remetia a eles e trazia algo tão bom. Enquanto para a Tânia, pelo vestido fazendo um contorno circular longo, via logo um barrigão, não pensava na criança, mas numa gestação. Não sabia ela que exatamente naquele dia da pintura, em um estado vizinho, o Gael nascia. As fotos da Tânia e da Clarissa, junto ao Gael, hoje em dia com dois anos, saudável, sorridente, muito inteligente e simpático, conversam com cada uma das pinturas do café. E é muito incrível ver como, de todas as formas, elas estavam esperando por ele. A Clarissa tem 37 anos, é bancária, adora mexer com plantas, reviver plantas, replantar e cultivar. Ela também toca violão e canta (gravou em estúdio a música para a Tânia entrar no casamento! Olha que incrível!). Ela adora esses detalhes, trata-os com muita atenção e carinho. A Tânia tem 43 anos, é historiadora e pedagoga, brinca que é artista plástica autodidata, porque dá aula de artes e de pintura há muitos anos também. Antes dos murais, ela nunca tinha pintado usando giz de cera, sua especialidade era tecido e madeira. A história do giz começou por uma reforma na escola e pela falta de dinheiro para comprar materiais para a pintura acontecer, então ela viu que tinha muito giz e pensou que poderiam inventar algo novo. Enquanto a história dos tecidos, essa vêm de longa data: ela já apresentou até programa na TV ensinando outras pessoas a pintarem seus próprios tecidos em casa. A Tânia e a Clarissa são mulheres muito atenciosas e logo que você chega é completamente impossível não se contagiar pela energia delas. São pessoas que se movem por afeto e contam histórias de vezes que já comemoraram datas com violinistas, de votos de amor que fazem por aí, das aventuras de anos casadas… são muitas risadas que vamos trocando ao longo das conversas, porque mesmo que os assuntos não sejam tão fáceis ou que existam os perrengues, fica claro o tempo todo que elas querem fazer o bem. Por fazer o bem que elas se conheceram, inclusive. Foi num grupo de Whatsapp onde LGBTs se reuniam para promover doações que quebravam o preconceito. Infelizmente ainda existe um olhar para nós de que só queremos festas, coisas vistas como “libertinagens” e não levamos nada à sério (e tudo bem querer festa, viu gente?), mas para quebrar essa ideia tão retrógrada esse grupo se uniu visitando lares de idosos, praticando doações, distribuindo coisas, etc. A Clarissa se interessou pela Tânia, chamou ela no Whatsapp e passaram quatro horas conversando. Marcaram de sair e foram ao teatro, já que ambas amam teatro. E, dessas saídas ao teatro, já se passaram mais de 8 anos, né? Cá estamos. Depois que elas se conheceram, se apaixonaram e namoraram por um tempo, resolveram morar juntas. A Tânia já tinha dois filhos maiores de vinte anos e isso fez com que fosse ainda mais difícil para a mãe da Clarissa a aceitação do relacionamento, portanto elas passaram o primeiro um ano e meio sem contato direto com as famílias. Mas não foi por falta de tentativa, não, viu? Tânia tentou, mandou e-mails, fez o que estava ao seu alcance, mas não conseguiu. Depois de um tempo, o irmão da Clarissa começou a namorar e foi apresentar a namorada, então elas resolveram dar um basta: só iremos se a Tânia puder ser apresentada também. Ok, baixamos a guarda. A Tânia foi convidada. E ela? Viveu um dia de gala! Foi ao salão, comprou até roupa nova para a ocasião. Deu tudo certo, todos se deram bem. O mais curioso é que a mãe da Clarissa e a Tânia se parecem muito, não só no jeito, mas ambas são professoras e artistas, então a mãe sempre soube quem era a Tânia por ver ela na TV, mas não dava o braço a torcer. Depois, quando se conheceram e se deram bem, tudo foi ficando mais tranquilo, mas levou muito tempo para que elas não se sentissem mais pisando em ovos. Desde o começo a adoção sempre estava em pensamento, por ser um sonho de muitos anos da Tânia. A Clarissa adorava a ideia, mas ambas achavam muito cedo. Deixaram a hipótese ao futuro, para amadurecer depois do casamento. Quando o casamento chegou, a notícia foi dada num almoço de família, depois de três anos juntas. A mãe da Clarisse perguntou “Mas por que vocês vão casar? Se já moram juntas há três anos?!” e ela respondeu: “Por que a senhora casou? Então. A motivação é a mesma.” = aí, ninguém argumentou mais nada. Sobre o casamento, o assunto já estava vencido, mas ainda sentia-se uma dor porque tiveram pouquíssima participação familiar no envolvimento em si… pouco perguntava-se sobre o evento, elas organizaram tudo sozinhas, cada detalhe, e foi difícil lidar com esse sentimento de solidão. Na data da festa, o pai da Clarissa entrou com ela e foi muito receptivo com os convidados, enquanto a mãe ficou mais reclusa. Recordam que a cerimonialista falou coisas muito profundas e importantes sobre o amor e sobre quem nós somos, e citam que isso despertou uma mudança comportamental na forma que a mãe da Clarissa vê o relacionamento das duas, portanto, valeu sim, muito a pena. Em relação à adoção, elas contaram da mesma forma que o casamento: o irmão da Clarissa ajudou e elas organizaram uma pizza entre a família para dar a notícia. No começo, o maior medo que surgiu foi em relação ao processo, como seria, e de certa forma sobre alguns preconceitos que envolvem a adoção, como “Como será que vai ser quando a criança crescer? / E se ele/ela quiser procurar a família biológica? / etc”, além disso, existia um pensamento sobre a Clarissa nunca ter filhos pelo o que ela representa socialmente, uma mulher que não se mostra feminina, não encaixa num padrão socialmente colocado que desde criança não mostrava brincar de bonecas e nem ser muito materna… [E justamente nesse momento nos surge a dúvida: Por que isto vira um debate quando a Clarissa anuncia o desejo de adoção e nunca vira um debate em famílias no momento em que os homens contam que vão ser pais? Nunca um homem é cobrado sua paternidade, já para nós, mulheres, sempre nos é cobrada uma posição materna e se não temos uma boneca em casa nos é descartada a possibilidade ao crescer. Ainda bem que Clarissa seguiu o sonho porque hoje em dia ela é uma mãezona!] Enfim, o sentimento que os familiares ficaram foi de: quando acontecer, a gente vê. Foi então que elas entraram com os papéis no fórum e acompanharam mensalmente os encontros em grupo sobre adoção. Depois de um ano, os pais (avós do Gael) estiveram também nesses encontros, o que foi muito legal porque mudou bastante a visão sobre a adoção, e lá foram reaprendendo formas de enxergar e de se preparar para recebê-lo da melhor forma possível. Depois de um ano e meio elas estavam aptas a entrar num grupo de busca ativa por crianças para adoção. Lá, chegaram a tentar uma criança, enviaram os documentos, mas não tiveram retorno judicial (em agosto de 2019), então voltaram à busca. Em novembro, dia 20, de Zumbi dos Palmares e da Consciência Negra, elas estavam em uma peça de teatro (olha aí, o primeiro date voltando à tona), e quando pegaram o celular para fotografar um momento da peça porque Tânia queria mostrar aos alunos na escola, viram no Whatsapp a foto do Gael. Tânia, em lágrimas, conta que sentiu o coração palpitar muito forte e só conseguiu dizer: é o meu filho! A informação que tinham era de que o Gael não estava em São Paulo e que era um neném com síndrome de down, possuindo também uma bolsa de colostomia. Elas nunca tinham pensado na hipótese da síndrome de down porque não existia essa opção no questionário que responderam, mas na mesma hora não havia mais dúvidas, apenas a certeza que o Gael era o filho que elas estavam buscando. A Clarissa brinca que não conseguiram mais nem ver a peça, choravam e ela tentava conversar para acalmar e ser um pouquinho mais pé no chão, saber se era isso mesmo que elas queriam, mas ambas estavam muito emocionadas. Ao fim, foram para o estacionamento, conversaram e ligaram para a filha da Tânia. Na hora que ela viu a foto, não deu nem tempo, só disse “Mãe, é ele, né??? É o meu irmão! Pega ele! A gente estimula ele, mãe!! Vai dar certo!”, naquele momento tudo foi se encaixando, a filha dela trabalha com crianças que possuem síndrome de down e na época auxiliava 6 crianças numa escola. Em seguida, ligaram para o filho, que também apoiou. Foi o bastante: deram o sim para a assistente social. Os dias seguintes se resumiram em pura ansiedade. Enviaram os documentos e o processo demorou mais de uma semana, passaram por entrevistas, por assistentes sociais… Tânia estava tão ansiosa que resolveu ir até a casa de duas amigas mais velhas, maiores de 80 anos, cujo ela apelida de yabás. Elas falaram: “Calma que ele é teu, ele já vem”. Foi quando ela chegou em casa que recebeu a ligação do fórum e falaram: chegamos à conclusão de que não existem mães melhores para ele do que vocês duas. Compraram as passagens aéreas, alugaram airbnb, marcaram audiência e o mais rápido possível foram conhecê-lo. Conversaram muito com as assistentes, com o fórum, afinal, tudo precisa ser minimamente acertado. A família (como um todo) ainda não sabia, porque o medo de não dar certo era grande, deixaram para contar quando já estivessem lá. E finalmente chegou o momento aprovado de conhecê-lo: lá estava o Gael, neném pequenino, gordinho, com os olhos super curiosos, acompanhado de uma sacolinha de plástico com suas roupas. Elas foram com ele até o apartamento onde estavam hospedadas. Todos estavam enviando mil mensagens para o celular, mas fizeram chamada de vídeo com a filha da Tânia. Gael, quando a viu, abriu um sorrisão. Foi o primeiro sorriso dele, como se já a conhecesse. Ele foi muito bem recebido por todos na família e é uma criança muito amada. Elas afirmam: “Ele nos ensina coisas que nenhuma faculdade ensinaria, nenhum curso”. A vida gira em torno do Gael, que ao todo faz 6 terapias, hidro, fono, fisio, uma rotina intensa! É sempre de sorriso no rosto! E vai melhorando a cada dia. Hoje ele já não usa mais a bolsa de colostomia, passou pela cirurgia e correu tudo bem! Falamos sobre a importância de darmos valor aos pequenos grandiosos acontecimentos ao nosso redor, como as necessidades fisiológicas diárias. E tudo o que isso nos ensina. Nesse momento, a Tânia conta que no dia do casamento elas fizeram votos falando sobre o quanto são pessoas melhores depois que se conheceram… mas que depois do Gael, elas sentem que são pessoas que nem imaginavam conhecer/e ser. Sentem que vão sair dessa vida muito melhores. Hoje, também, depois de tantos anos, ambas famílias se dão super bem. No mais, elas mantém o Instagram do Gael, para falar sobre educação inclusiva, famílias homoafetivas e crianças com síndrome de down. O @ é @gael.t21 a palavra está com elas Acreditamos que o amor supera tudo, nele não tem raiva, não tem inveja, não tem maldade. Eu (Tânia) vivi uma situação que me lembra do amor. Foi com a minha sogra. Ela é muito parecida comigo e um dia eu fui viajar para o interior sozinha à trabalho. Por mais que eu já namorasse a Clarissa há anos e já conversasse com a minha sogra, ela nunca tinha falado comigo no Whatsapp, mas nesse dia, especificamente, ela me mandou uma mensagem perguntando se eu cheguei bem. Ou seja, ela ficou preocupada, né? Me surpreendeu e eu agradeci. Aí ela disse que, ah, era assim mesmo, “com o tempo ela ia vendo como são as coisas”... e eu disse que o amor é só isso, mesmo, mas que amor também é tudo isso. É essa coisa que une, que move, que faz com que a gente se preocupe e que faz passar por esses desafios. Nós,mulheres, amarmos outras mulheres, nos faz passar por muitas coisas e muitos desafios, então o amor surpreende e fica muito latente. Mas nem sempre a gente sabe como demonstrar, então é importante saber ler também. E o Gael estar numa família homoafetiva é maravilhoso porque já passamos por tantas coisas que ele será completamente acolhido aqui, voltamos a realmente aquele ponto: nos preparamos a vida toda pra isso. post Começou 2022! Precisamos começar o ano fazendo todos vibrarem com uma das maiores histórias que já tivemos o prazer de documentar, então, preparou o lencinho? Chegou a hora. Aproveitem ♥ Queria contar a história da Tânia e da Clarissa (e do Gael, claro) de uma forma que tudo se completasse, porque a vida delas acontece assim. Diversas vezes, desde que nos encontramos em São Paulo - cidade em que elas nasceram e moram com o Gael - falamos no sentimento que existe sobre a vida tê-las preparado para a chegada dele. E isso não significa que ter um filho e educar uma criança de forma inclusiva é tarefa fácil ou, que nesse caso, venha com receita pronta, mas que elas estavam de braços abertos e muito dispostas para receber tudo o que aprendem e compartilham diariamente. A forma de começar a contar essa história vai ser pelas fotos porque escolhemos fazê-las num local muito especial, um café, localizado no bairro da Mooca. Esse café foi a Tânia quem pintou, com giz de cera, cada uma das paredes. Quando ela pintou, não imaginava que adotaria o Gael, mas já estava com o processo de adoção bastante avançado no fórum e tinha feito uns murais na escola em que trabalhava, quando o dono do café foi matricular a filha, os viu e decidiu contratá-la; foram dez dias de muitos desenhos nas paredes… mas um desenho em especial, de frente para a cozinha, era o preferido do casal (e também da Tânia!): uma menina no balanço, lendo um livro. Enquanto pintava, Tânia resolveu perguntar o motivo deles terem gostado tanto do desenho e a resposta foi que remetia à uma criança com síndrome de down (a esposa do dono do café é fisioterapeuta e tem essa especialização). A menina, com seus dedinhos curtos, segurando o livro, de olhinho puxado… remetia a eles e trazia algo tão bom. Enquanto para a Tânia, pelo vestido fazendo um contorno circular longo, via logo um barrigão, não pensava na criança, mas numa gestação. Não sabia ela que exatamente naquele dia da pintura, em um estado vizinho, o Gael nascia. As fotos da Tânia e da Clarissa, junto ao Gael, hoje em dia com dois anos, saudável, sorridente, muito inteligente e simpático, conversam com cada uma das pinturas do café. E é muito incrível ver como, de todas as formas, elas estavam esperando por ele. A história completa está no nosso site! O caminho até lá você já sabe, né? O link tá na bio!
- Marcela e Karine
A Karine e a Marcella são aquelas pessoas que jamais conseguiriam viver sem arte na vida. Arte em todos os aspectos: a cultura no cotidiano, passando pela pintura, pelo teatro, pelo cinema ou pela dança. Dentro do apartamento em que elas moram em São Paulo fazem uma produtora acontecer - e dessa produtora já saiu websérie, ideia para Canal no Youtube, filme, peça… tudo vira vida. A produtora criada em 2018/2019, com nome La Loba, vindo do livro Mulheres que Correm com Lobos, foi um passo muito importante também para elas colocarem em frente o que acreditam: a liberdade no criar. Roteirizar, filmar, dialogar com novos atores. Criar cenas e redescobrir aspectos de criatividade, ainda mais dentro de casa, é um desafio divertido. Quando falamos sobre as ferramentas de gravar dentro de casa (por elas terem as ferramentas necessárias, desde equipamento técnico até o suporte para lançar, como o YouTube ou outras plataformas), elas comentam também que não admitem a ideia do artista pobre, essa coisa de que o artista precisa vender o almoço para comprar a janta. Não que precisem viver o luxo, mas que querem suas profissões respeitadas e valorizadas para que tenham uma vida confortável e saudável: “Ter o trabalho reconhecido”. Suas competências artísticas são enormes, estudaram (e estudam!) há anos para construir isso e é um exercício diário relembrar o quanto o teatro, a peça, o filme, a dança, a música, a expressão artística é tão importante para o nosso dia-a-dia quanto tantas outras coisas que fazemos. Karine é de Tatuí, cidade intitulada como Capital da Música, interior de São Paulo. No momento da documentação ela estava com 33 anos e contou sobre um projeto do Governo do Estado de São Paulo em que estava fechando diversos cursos universitários lá na cidade natal dela (local que a família reside até hoje), incluindo o curso que ela fez, de Artes Cênicas, que já estava encerrado. Falou sobre a dificuldade de se ver longe e ver uma cidade com tantas potências, com um dos maiores conservatórios de música da América Latina, resistindo, mas sem muitas forças perante um poder tão maior que é o legislativo. Mas que, mesmo com todas essas sensações de cultura sendo levada “embora”, não desistiria, pois da mesma forma que ela esteve lá por tanto tempo ainda há pessoas muito boas fomentando a arte nessas cidades - e não só: a arte, a história, os eventos culturais, os projetos de voluntariado, etc. A Marcella também tem uma trajetória de busca pela cultura no interior de São Paulo, mas dessa vez em Piracicaba. Ela estava com 32 anos no dia em que nos encontramos e contou que a sua trajetória na arte da cidade foi impulsionada quando começou a fazer um curso no SENAC (e, nesse curso, também conheceu a Karine). O ano era 2016, encenaram uma peça sobre A Paixão de Cristo, aprenderam muito e até ficaram amigas, mas o tempo passou e não se falaram mais. Como a cidade é pequena e todos acabam se encontrando nos espaços, em 2018 elas fizeram outra peça novamente. Estavam solteiras, interagiram e o interesse surgiu. No fim, (ou melhor, no começo) começaram a namorar. A vida em Piracicaba, mesmo que confortável, estava um pouco limitada para a carreira da Karine e da Marcella. Foi então que surgiu a oportunidade de morar em São Paulo (capital). A Karine já tinha morado em São Paulo por um tempo, sabia como a cidade funcionava, a alta opção de cursos, abrangência para novas áreas e também a concorrência muito maior de artistas chegando de todos os lugares, mas lá em Piracicaba não via mais a carreira andar no momento em que estava… e a Marcella topou o desafio. Juntas, com o incentivo de uma amiga, realizaram a mudança. Logo no começo da pandemia encontraram a casa que moram agora, um lar maravilhoso e que foi se completando com o jeito delas em cada cantinho. Foi lá que gravaram a websérie, é lá que possuem as melhores (e piores!) ideias para as próximas produções e brincam que a casa é uma grande geradora de ideias. Elas se veem como parceiras. São muito amigas e sobretudo essa companhia se torna uma âncora. Sentem amor pela companhia. Além do amor que compartilham pela arte em si e por tudo o que são envolvidas, existe o amor que sentem por estarem juntas. A arte é um refúgio e a relação delas é uma parceria. Em casa adoram assistir Simpsons, Friends, cozinhar e durante o preparo da comida fazer pausas para dançar… Também trocam momentos de criação pintando telas, criando plaquinhas e decorações para a casa, amando os filhos de quatro patas e cuidando das plantas na varanda. Não só juntas, elas também falam da importância dos momentos de solidão. De reflexão e estudo - tanto de livros quanto de estudar a si mesmo. Para a Karine, o amor veio num entendimento sobre quem ela é e isso levou muito tempo, porque ser uma mulher lésbica artista já é um processo de autoconhecimento imenso para sair de muitos padrões e “caixinhas” que nos são colocadas. “Estar livre disso e aberta para que alguém possa te olhar e te amar é um dos passos mais importantes”. Então amar a si mesma e amar a Marcella foi um processo que aconteceu de forma natural (não fácil, claro), mas na dor ou na felicidade, foi acontecendo diariamente. Essa relação de autoconhecimento reflete na Marcella através do respeito a si própria, pois ela conta que antes ela não se via com tanto respeito - hoje ela aceita que adora dançar, por exemplo, e dança! Ela respeita quem é e respeita quem a Karine é. E isso é um dos maiores aprendizados que tira da relação. No fim da nossa conversa tiramos um outro aprendizado, sobre a expressão artística em si no que envolve esse amor além do preço que colocamos nas coisas, pelo puro sentimento de quem somos e do que gostamos/amamos fazer. A Karine dá o exemplo de que uma vendedora pode continuar sendo vendedora e cantar super bem, ou um motorista de ônibus pode ser o melhor motorista e mesmo assim um ótimo pintor… a arte deveria ser vista enquanto uma conscientização social sobre a importância de fazer arte, da expressão artística, do quão essencial para o ser humano ela é - para isso, enfim, gerar coisas boas para o nosso redor enquanto sociedade. E viver essa arte, para fora do capitalismo (ou seja, você não precisar vendê-la para ganhar dinheiro/nem tudo o que você tocar precisa virar ouro) é o que elas gostariam de ver sendo refletido por aí. Marcella Karine
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Nossos serviços Juliana - Consulta 1 h 50 Reais brasileiros R$ 50 Agendar agora Consulta 1 h 45 Reais brasileiros R$ 45 Agendar agora
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Espaço de Pesquisas Oi! Este é um espaço do qual você pode pesquisar e encontrar histórias de mulheres que participaram do nosso projeto por todo o Brasil! Legal, né? Pra usar, basta digitar no espaço de pesquisa alguma palavra-chave, por exemplo: alguma profissão, alguma cidade, algum tema... É o nosso verdadeiro banco de dados - o primeiro, da história das mulheres que se relacionam afetivamente com mulheres - e precisa ser valorizado! ♥ Todos (61) Outras páginas (59) Serviços (2) 61 itens encontrados para "" Outras páginas (59) Apoio Psicológico | Documentadas saúde mental e apoio psicológico para mulheres de todo o Brasil Considerando a importância da representatividade para a construção da identidade de pessoas LGBTs e compreendendo as condições atuais do nosso país e do mundo, criamos no Documentadas uma rede de apoio psicológico. Através da psicoterapia ou da análise, uma profissional acompanhará, ouvindo e proporcionando um espaço de acolhimento para as vivências, sofrimentos e inquietações das mulheres que passam pelo projeto. Nesse primeiro momento, para atender mulheres que amam mulheres e que acompanham o projeto, criamos uma rede de psicólogas e psicanalistas que estão com vagas sociais para atendimentos individuais e online. Apostamos neste espaço porque sabemos o quão difícil é encontrar um ambiente seguro para ser escutada com atenção e cuidado. como funciona? Somos em dezoito profissionais - entre psicólogas e psicanalistas - e temos vagas à preços sociais, cada qual com a sua disponibilidade. Entendemos a importância de abrir essas vagas à valores mais baixos exatamente pela condição financeira particular de cada mulher e econômica que o país enfrenta. Estamos com o propósito de atender mulheres que precisam e que não encontram disponibilidade de atendimento de forma acessível nos meios particulares pagos. Toda mulher poderá se registrar na nossa plataforma acessando a área de login ao final dessa página. Assim, poderá fazer um cadastro dentro da nossa plataforma, consultando o perfil de cada profissional e a disponibilidade de horário/vaga que melhor se adapta à sua rotina. Todos os valores são iguais, o que difere na hora da escolha é a profissional identificada através do breve currículo e da sua disponibilidade. Assim que o prévio agendamento for realizado, o contato entre ambas será feito e a psicóloga mandará uma mensagem. Para ler maiores informações sobre a nossa Política de Privacidade e os Termos de Uso de plataforma, clique aqui ♥ nosso grupo de psicólogas e psicanalistas apoiadoras Viviane Psicóloga graduada pela PUCRS, especialista em Clínica Psicanalítica (UFRGS) e mestranda em Psicologia Social na UFRGS. CRP: 07/23395 Maria Clara Goes Psicóloga mestra sobre saúde sexual de mulheres cis lésbicas, pela Universidade Federal da Bahia. Praticante da Psicanálise - CRP 03/27093 Marina Albuquerque Psicóloga graduada pelo Centro Universitário IESB e especialista em Psicologia Humanista. CRP-01/19203. Laís Tiburcio Psicóloga Clínica, Pós-graduanda em Gênero & Sexualidade, formação em Politica Nacional de Saúde LGBT. Estudos em Psicanálise. CRP 05/57276 Ariadne Sitaro Psicóloga Pós Graduanda em Gestalt Terapia e Reprodução Humana Assistida. CRP 02/28387 Júlia Psicóloga - Mestrado na Universidade Federal Fluminense em Psicologia. - CRP 05/60076 Mariana Milan Psicóloga formada pela Universidade Federal de Santa Catarina. CRP 12/26613 Ana Carolina Cotta Psicóloga pela Universidade Federal Fluminense - mestrado em Psicologia Social na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. CRP 05/58463 Raquel Psicóloga formada pela Faculdade de Pato Branco/FADEP e pós-graduada em Gênero e Sexualidade CRP 12/23076 Camila Psicanalista. Membro provisório do Centro de Estudos Psicanalíticos de Porto Alegre/RS (CEPdePA) e Advogada Especialista em Direito Público Maria Freire Psicanalista pela Escola Letra Freudiana. Doutorado em filosofia. Deyse Van Der Ham Psicóloga - Especialista em Políticas Públicas e Assistência Social pela PUCRS. CRP 07/24426 Marina Nobre. Psicóloga formada pela Universidade de Fortaleza. CRP 11/15307 Caroline Afonso Psicóloga formada em psicologia pela Universidade Luterana do Brasil Canoas/RS. CRP 07/38059 Gabriela Nunes Psicóloga formada pela UNISINOS e pós-graduanda em Psicologia Clínica pela PUCRS. CRP 07/41102 Talyta Psicóloga - graduada pela Universidade do Oeste Paulista (Unoeste) - estudos em psicanálise. CRP 06/169049 Paula Psicóloga, formada pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e pós graduanda em Psicopedagogia. CRP 05/63682 Thays Waichel Psicológa graduada pela Universidade Luterana do Brasil - Canoas/RS. Ênfase em Orientação Psicanalítica. CRP 07/37003 Jamyle Psicóloga - Mestrado em lesbianidades a partir de uma perspectiva interseccional, pela Universidade Federal do Ceará. CRP 11/18191 Ana Gabardo Pedagoga pela Universidade Federal do Paraná e psicanalista pela Associação Livre Centro de Estudos em Psicanálise Dani Psicologia Social, Psicanálise e Educação - Universidade de São Paulo. CRP 06/137811 Larissa Psicóloga formada pela Universidade Anhembi Morumbi em São Paulo. CRP 06/161422 Kíssila Psicóloga formada pela UFF e pós-graduanda em Fenomenologia Decolonial e Clínica Ampliada pelo NUCAFE. CRP 05/69513 Jade Psicóloga formada pela Uniritter - RS. CRP 07/34186 Ana Clara Ruas Psicóloga pela Universidade Federal Fluminense (UFF) em Niterói. CRP 05/66226 quer ter acesso à terapia/análise ou entrar em contato com a profissional? clica aqui Documentadas Olá; AQUI REGISTRAMOS O AMOR ENTRE MULHERES ATRAVÉS DA FOTOGRAFIA. Portfólio Para conhecer nossas histórias, clique aqui > sobre 02 sobre nós Olá, me chamo Fernanda e registro de forma documental o amor entre mulheres por todo o Brasil. O documentadas começou através de diversos estudos e da percepção de que as mulheres são pouquíssimo registradas em toda a sua história, principalmente tratando-se de mulheres que se relacionam afetivamente com outras mulheres. Para dar um basta e contar nossa própria história, percorro o país registrando casais e através desse site criamos conexões e laços de fortalecimento. Para conhecer quem faz o documentadas, clique aqui > Banco de images QUER PARTICIPAR DO PROJETO? vem por aqui! :P Mariana Musicista Leia mais Mari, além de ser uma pessoa extremamente doce, é uma musicista e compositora incrível! Ela tem um canal com a Vivi e juntas compõem histórias no Canta Minha História! Iasmim Advogada Iasmin, além de uma mulher super sorridente e alto astral, é também uma grande advogada. Natural de Duque de Caxias, baixada fluminense, hoje trabalha em um escritório no centro do Rio de Janeiro. Leia mais Carla Professora Carla, além de ser grande amante das artes e do teatro, também é professora e pedagoga em escolas públicas de Rio das Ostras e Macaé. Leia mais gerando renda para a comunidade Acreditamos que - além de que contar histórias de mulheres - podemos conecta-las. Falarmos sobre seus trabalhos, compartilharmos situações, momentos e, enfim, gerarmos renda. O mercado de trabalho segue difícil e podemos nos apoiar contratando trabalhos de mulheres da comunidade LGBT. Sendo assim, no nosso espaço de 'busca' você consegue pesquisar pela palavra-chave (o serviço que você precisa), ver qual profissional está à disposição, ler sua história e nos mandar uma mensagem. Nosso papel será te conectar diretamente com a profissional desejada! gerando renda para o projeto Manter o projeto não é tarefa fácil! Fazer viagens, pegar metrôs, ônibus, barcas... disponibilizar tempo e conseguir manter as contas pagas é um grande desafio. E como queremos documentar o maior número de casais possíveis, disponibilizamos o nosso PIX e aceitamos qualquer valor como quantia de doação! Você pode nos ajudar clicando aqui e fazendo a doação (qualquer valor!) de forma voluntária direto pelo aplicativo do seu banco! Colabore com a documentação histórica do amor entre mulheres! nossa loja tá no ar! chega pra cá ♥ Contato Natália e Bruna | Documentadas Bruna diz que ficou até surpresa quando a Natália contou o desejo de inscrever elas no Documentadas, brincou dizendo “Quem te viu, quem te vê, hein?!” porque no começo da relação, principalmente na primeira viagem que fizeram juntas, Natália tinha bastante receio até de pegar nas mãos em público… E agora quer mostrar ao mundo que o amor que vivem é lindo. Entendemos que esse medo é legítimo, assim como essa vontade de afirmação. Bruna completa: a história de amor delas também é a história de descoberta da Natália. Para Nat, o amor precisa ser por completo, ou seja, as pessoas merecem ser amadas como são. Se uma pessoa só te ama se você for heterossexual, ela não está te amando. Existe uma busca na perfeição do que criamos em cima dos outros, mas a verdade é que precisamos aceitar quem eles se tornam, quais profissões escolhem, a forma que entendem o amor, com quem se sentem bem ao relacionar, como vão compartilhar a vida… Isso tudo também é amar. Ela explica que a Bruna traz liberdade, foi um combo: a Bruna + a gatinha dela + o lar é o jeito que elas são felizes. Tudo fica nítido, é estampado a forma que se sentem confortáveis juntas. Não existe um julgamento dentro de casa. Quando uma relação existe e se fortifica é porque ali está o amor, assim enxerga Bruna. O amor a gente encontra na rotina, na construção das pequenas coisas, crescendo, cuidando, estando ali diariamente para se ajudar. Com a Natália foi a primeira vez que ela sentiu de forma plena o equilíbrio: ela pode se doar e vai receber de volta, é acolhedor. Natália, no momento da documentação, estava com 34 anos. Nasceu em Barra do Piraí, interior do Rio de Janeiro, mas foi ainda criança para Niterói e seguiu sua vida na cidade. É formada em jornalismo e fez transição de carreira recentemente, está estudando nutrição. Adora ver filmes, séries, ler e estudar o vegetarianismo e o veganismo. Atualmente, mora no Rio de Janeiro, junto à Bruna, e estão desbravando a cidade, conhecendo novos teatros, parques e outros lugares. No dia seguinte à nossa documentação elas iriam participar da primeira corrida juntas, pois estão focando em atividades físicas no momento. Bruna, no momento da documentação, estava com 36 anos. É natural do Rio de Janeiro, da zona oeste da cidade. Trabalha enquanto enfermeira e atua no ambiente corporativo, cuidando da saúde no trabalho. Além disso, faz trabalhos de marketing digital, adora a área do design e também está estudando tarot, que sempre foi um hobbie. No dia a dia, gosta de praticar exercícios dinâmicos (esportes em geral) e também curte dirigir, se sente calma quando dirige. Entre o réveillon de 2022 para 2023, durante a festa da virada de ano, Bruna e Natália se conheceram. Inicialmente não era nessa festa que Natália iria, ela e a amiga haviam comprado ingresso para outra, mas foi cancelada, então deram a opção de reembolso ou de transferência para uma festa que aconteceria na Barra da Tijuca. Elas, saindo de Niterói, acharam bem ruim a opção de ir para a Barra, mas com o valor do reembolso não conseguiriam comprar outra festa então toparam. Bruna, diferente delas, tinha macado com os amigos para ir na festa da Barra mesmo, sabia que era uma festa com um público muito hétero, que só iria ela e um amigo gay, mas topou ir porque queria se divertir. Logo que chegou, Bruna olhou para Natália. Elas não possuíam amigos em comum, estavam apenas próximas e trocaram olhares. Natália estava apenas com a amiga e percebeu os olhares, mas até então se entendia enquanto uma mulher héterossexual e achou estranho, até engraçado isso acontecendo… A festa seguiu e os olhares também. Bruna então comentou com o amigo sobre elas trocarem olhares e quando ele percebeu, disse que estava sim e a incentivou a ir falar com ela. Quando ela ia tomar iniciativa, um homem chegou até à Nat, e quando ela se livrou dele, Bruna não estava mais lá. Depois da meia noite se reencontraram porque o amigo da Bruna fez amizade com um grupo de meninos gays que a amiga da Natália também havia feito amizade, e assim elas se percebem neste grupo. Dançaram juntas, Bruna chegou rápido na Natália e ela indagou: “Que isso, não vai nem perguntar meu nome?” - então elas falaram os nomes e se beijaram. Natália já tinha ficado com uma menina antes, quando era adolescente, mas seus relacionamentos sempre haviam sido com homens. A festa foi acontecendo e elas não tiveram muitas interações, se encontraram novamente 6h da manhã quando tomaram café e a Bruna foi solicita ajudando a Nat a levar café da manhã para a amiga. Foi quando Nat perguntou como a Bruna se identificava e ela respondeu “Enquanto mulher lésbica, e você?” e ela disse que era bissexual. Ela não pensou muito, isso chegou muito naturalmente e pontual. No dia seguinte conversaram bastante e assistiram à posse do Lula juntas, de forma online. Na semana seguinte ao réveillon tiveram um encontro, se divertiram bastante e passaram a se encontrar com frequência. Ainda em janeiro viajaram juntas e na semana seguinte, dia 4 de fevereiro, começaram a namorar. Quando Bruna soube que Natália não havia ficado com mulheres antes, resolveu ir com mais calma, mas não adiantou, o namoro já estava encaminhado. Foram muitos meses no início da relação indo da zona oeste até Niterói, um caminho bastante longo, para se encontrar - ou melhor, a Bruna indo e voltando buscando a Natália para passar o final de semana na casa dela. Existia um receio muito grande de contar para a família da Nat, então tudo foi acontecendo aos poucos. Somente no começo de 2024, mais de um ano depois de se conhecerem, Nat se abriu para seus familiares. Desde então, não possui mais contato com a sua mãe. Por mais que os outros familiares ainda conversem e acompanhem (ainda que não queiram saber sobre o relacionamento) ela sente muito sobre, é muito triste ficar longe de uma das pessoas que mais ama. Entendem que eles terão seu próprio tempo para processar, assimilar e superar o preconceito, mas que nesse tempo elas não podem deixar de viver o amor mais bonito que já sentiram. Para Natália, o amor que vive com a Bruna é o sentimento mais bonito que já presenciou, que já viu acontecer… é respeitoso, é companheiro e não existe opinião que vá tirá-lo do caminho. Entende também que isso não apaga o que tanto ela, quanto a Bruna, já viveram em outros momentos da vida, em outras relações (que também já foram boas) ou em outras formas de viver, que isso tudo faz parte da construção de serem quem são, e que se esforçam muito para serem as melhores pessoas possíveis, mas que em nenhum momento sucumbirão à um pensamento preconceituoso. Então respeitam o tempo, por mais que doa muito, mas se permitem viver. Pela parte da família da Bruna, recebem muito suporte da mãe, que as trata com muito carinho e afeto. ↓ rolar para baixo ↓ Natália Bruna Ver todos Serviços (2) Juliana - Consulta Consulta Ver todos


