Conheci a Fernanda e a Ana Carolina um dia depois que elas oficializaram o namoro. Nos encontramos no Parque Lage, Rio de Janeiro. Por mais que assuste um namoro tão recente sendo já documentado, a história delas começou muito antes disso - e vocês entenderão no decorrer do texto.
Fernanda, no momento da documentação, estava com 27 anos. Trabalha enquanto advogada e pesquisadora, está terminando o mestrado. É natural de Paracambi, reside lá com alguns familiares. Adora ir em shows, ouvir música, cozinhar, ler… Gosta de rever os amigos, tomar um café ou comer um lanche juntos, trocar ideias e fofocar. Brinca que tem alma de gente velha.
Ana Carolina estava com 26 anos no momento da documentação. É natural de Campo Grande, no Rio de Janeiro, mas mora em Seropédica, baixada fluminense. Está finalizando a graduação em contabilidade e trabalha como assistente administrativa. Gosta de passar seu tempo livre assistindo séries, saindo com os amigos e consumindo conteúdos sobre gatos na internet.
Nos encontrarmos no Parque Lage foi uma escolha especial porque há pouco tempo atrás Fernanda conheceu o local e prometeu que levaria Ana. Além disso, o parque é vizinho do Jardim Botânico, lugar onde ambas possuem muitas lembranças boas de suas infâncias com seus familiares. Fernanda conta que seu pai era fotógrafo e que passaram uma tarde lá fotografando. Ana, por sua vez, lembra das idas com a avó e tem até uma foto delas, no parque, tatuada. Entendem que essas são lembranças pessoais e muito importantes, agora, num local tão próximo, chegou a hora de criarem novas. Recomeçarem histórias.
Para Ana, o amor é um complemento bom na vida. Entende que relacionamentos não resumem quem somos, mas que no momento em que você se dispõe a ser o seu melhor numa relação isso acaba refletindo em muitas outras coisas fora da vida romântica, sua vida reflete a disposição.
Fernanda já viveu várias versões sobre o amor… Já acreditou no amor romântico, já viveu amores mais amplos, laços familiares e encantamentos com diversas relações. Explica que sempre se viu enquanto uma mulher insegura, não tinha muitos amigos e não achava que esse grande amor poderia realmente chegar. Nos últimos anos trabalhou isso e seus pensamentos acerca de amar, entender o amor como uma escolha, como um crescimento em conjunto. Acredita que são nas memórias criadas nas relações que vivemos (amorosas, mas não necessariamente entre casais) onde mora o carinho, os risos, as coisas boas.
O amor entre mulheres, para Fernanda, é um ato político. Se sente acolhida, representada, aceita nos lugares quando enxerga esse amor. “É muito importante não termos medo de falar sobre isso com as pessoas. Estar com uma mulher agora, participar de um projeto como o .doc, se ver em fotos… é sobre se enxergar nesses espaços também, entender a diversidade e representatividade, ver pessoas em quem se inspirar”.
A história da Ana e da Fernanda começa em 2016, quando Ana entrou na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e Fernanda já estudava lá. Eram cursos diferentes, mas haviam alguns amigos em comum e foi assim que, aos poucos, souberam da existência uma da outra. No decorrer do tempo, Ana se relacionou com uma amiga da Fernanda (que ouvia a amiga contando e torcia por elas), mas o relacionamento não vingou e elas acabaram perdendo o contato. Ana esbarrava com a Fernanda de vez em quando, porque Fernanda militava em um coletivo de mulheres bem presente na universidade, mas não conversavam. Esse foi o primeiro encontro-desencontro.
Em 2019 apareceram uma na vida da outra de novo. Dessa vez, Fernanda tinha outra amiga, que estudava com Ana e essa amiga queria apresentá-las. Fernanda até disse que já conhecia a Ana, explicou um pouco da história, mas o encontro não rolou. Foi mais um desencontro.
Com a chegada da pandemia de Covid-19, muitas relações começaram de forma online, com conversas enquanto estávamos cada um em sua casa. Fernanda conheceu uma pessoa, começou a conversar, e depois soube que a Ana também conversava com a mesma pessoa. Quando Ana soube da coincidência envolvendo a Fernanda, chegou a pensar: “Nossa, mas a Fernanda está em todo lugar, né? É onipresente!”. Como não se encontravam pessoalmente com a pessoa, Fernanda partiu para outra relação e em seguida começou a namorar. Foi mais um desencontro.
Um tempo depois, Fernanda e Ana se viram em um aplicativo de relacionamento e conversaram por lá. Chegaram a cogitar sair para beber (um date descompromissado), mas nunca aconteceu. Outro desencontro.
Foi só recentemente, em janeiro de 2024, que conseguiram se encontrar. Ana estava no LinkedIn e viu uma postagem da Fernanda, pensou: “Nossa, essa pessoa. Quanto tempo não vejo ela” e num misto de admirar o quanto a Fernanda é inteligente e interessante, surgiu uma paixonite. Decidiu puxar assunto no Instagram, Fernanda colocou ela nos “close friends”, começaram a interagir e surgiu o convite da Ana para saírem juntas.
O encontro aconteceu em janeiro mesmo. Ana vivia o final de um relacionamento aberto e Fernanda acompanhou, conversavam sobre. No primeiro encontro, Ana estava muito nervosa, principalmente porque Fernanda iria dormir na casa dela… chegou a comprar café da manhã, uma caneca específica porque “Vai que as canecas lá de casa não servem pra ela” e esperou ansiosamente no portão. Parte desse nervosismo se dava ao fato de que Ana nunca havia se relacionado com uma mulher. É bissexual, mas seus últimos relacionamentos foram com homens, via isso enquanto algo muito novo.
Tiveram um primeiro encontro leve. Conversaram, fofocaram, viram filmes, não tinham pretensão de se relacionar - até porque Fernanda havia desistido do amor e Ana ainda estava enrolada com seu outro relacionamento. Decidiram continuar se encontrando, Fernanda deu vários chocolates para a Ana, foram criando intimidade.
Ana não esperava se relacionar em seguida, acredita que depois do término a pessoa precisa ficar sozinha para processar tudo, mas sente que ali foi diferente e que aos poucos foi embarcando nessa nova ideia.
Começaram o mês achando que só seria mais um encontro, no meio do mês falavam que gostavam uma da outra e no final do mês já se sentiam apaixonadas. Trocavam pequenos presentes e cartinhas com declarações.
Como a relação teve início em janeiro deste ano (2024), tudo foi acontecendo rápido. O pedido de namoro, um dia antes de nos encontrarmos, foi todo temático de gatinhos. Era para o pedido ter sido feito durante essas fotos, mas aconteceu quase sem querer: Fernanda chegou na casa da Ana e foi cumprimentar os amigos que dividem lar com ela, mostrou a caixinha cochichando, até que Ana chegou na hora. Não quis disfarçar, o pedido foi feito sem ensaios.