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Beatriz estava com 25 anos no momento da documentação. Nasceu em Moita Bonita, povoado de Sergipe, mas cresceu em Aracaju, onde vive atualmente. Advogada criminal, ela atua no tribunal do júri, lidando com casos de homicídio - uma área desafiadora, especialmente para mulheres, que enfrentam o machismo diariamente na profissão. Reitera que sempre ao encontrar outras mulheres no júri, sente um misto de alívio e alegria, um sinal de que os espaços estão sendo conquistados. Também integra a Comissão de Diversidade da OAB em Aracaju, e desde que se entendeu enquanto mulher lésbica viu sua profissão unida à jornada pessoal de enfrentar a homofobia. Jornada essa que partiu de dentro de casa, desde os primeiros relacionamentos, lidando com invalidações da sua identidade e terapias de cura. Hoje em dia, no seu relacionamento com a Kika, pela primeira vez sua mãe aceitou conhecer a namorada, chamá-la pela forma correta e interagir como a família que são, conta, sorrindo, como têm sido legal viver essa experiência. 

 

Jirlana, ou Kika, como é chamada pelos amigos, estava com 30 anos no momento da documentação e é natural de Poço Redondo, cidade interiorana de Sergipe. Quando nos encontramos, estava em processo de mudança para Aracaju. Depois de cursar zootecnia e trancar a faculdade, ela planeja começar enfermagem na capital. Criada em um ambiente conservador, enfrentou um questionamento único quando se abriu sobre a sexualidade: “Existe tratamento pra isso?” e com calma e firmeza explicou que amar mulheres não é algo a ser "tratado", pois não é doença. A decisão de mudar envolve tanto a vontade de estar mais próxima de Beatriz quanto o desejo de liberdade que uma cidade maior oferece. 

 

São apaixonadas por cafeterias, principalmente para provar chocolates quentes. Conhecem várias em Aracaju, como o lugar onde fizemos as fotos, e quando viajam fazem questão de passear nelas pelos locais onde passam. Também costumam anotar as melhores, dando notas, para um dia voltar. 

Beatriz sente que seu relacionamento com Kika a faz viver plenamente, explorando juntas todas as possibilidades. Ela compartilha que, no dia anterior da documentação, foram juntas a um evento do trabalho, algo que antes parecia impensável. Em outros momentos da vida, Beatriz se sentiria mais retraída ao ir sozinha, mas Kika é sua parceira em tudo, alguém que a impulsiona na carreira, é amiga de seus amigos e ambas conquistam com o jeito extrovertido. Adoram sair, se divertir e fazer amizades. "A gente gosta de se amostrar", brinca Beatriz, destacando que se esforçam para tratar os outros com simpatia, como gostariam de ser tratadas. Sempre juntas, não perdem a oportunidade de aproveitar qualquer passeio ou evento, dispostas.

 

Beatriz relembra como, antes de Kika, não conseguia se imaginar em um futuro ao lado de alguém. Agora, tudo mudou. Elas se sentem livres para sonhar com uma vida compartilhada: construir uma família, ter filhos e morar juntas. Beatriz se descreve hoje como "grudenta" e ri ao contar que vive perguntando: "Vamos casar quando? Está demorando muito! Já pegou sua certidão de nascimento pra gente casar?"


Kika conheceu Beatriz por acaso e o início da conexão foi marcado por coincidências e resistências. Após uma festa perto de sua cidade, Kika conheceu novos amigos e viveu uma noite suuuuuper intensa, mas estava sem celular e no dia seguinte resolveu procurá-los no Instagram para compartilhar as histórias engraçadas que viveram. Beatriz era a melhor amiga de uma dessas pessoas que Kika tinha conhecido, então aparecia frequentemente como sugestão de amizade para Kika, que sempre recusava. Até que um dia cedeu e a seguiu, achando que Beatriz, com tantos seguidores, não retribuiria. Para sua surpresa, Beatriz seguiu de volta, viu alguns stories, puxou papo e a conversa começou.

No dia da conversa inicial, Kika estava curtindo uma “farra” na cidade - festa que acontece  com paredões de som, só que em terrenos mais afastados da cidade, para que ninguém reclame do barulho - mas decidiu voltar para casa mais cedo e postou um storie assistindo um filme, tomando sopa. Bia respondeu, puxando um assunto. Conversaram um pouco, porém, com a proximidade das festividades de São João, viviam entre trinta dias ininterruptos de festas de forró, então não mantiveram um clima de conversas frequente, era tudo muito esporádico, quando sobrava um tempo entre um show e outro, uma festa e outra. Até que, numa madrugada, enquanto Kika voltava de uma festa em um povoado próximo, Beatriz, sem conseguir dormir, mandou mensagem. Conversaram até o amanhecer, e desde então, nunca mais pararam.

Naquela época, Beatriz estava prestes a se mudar para Santa Catarina, mas o sentimento entre as duas cresceu tão rapidamente que desistiu da mudança. Elas brincam que começaram a namorar antes mesmo de se conhecerem pessoalmente, tornando o início da história tão inesperado quanto único.


Após semanas de conversas intensas, Kika decidiu ir até Aracaju encontrar Beatriz pessoalmente e dar início ao que já parecia ser um namoro. Ambas sentiam o amor florescendo, mas precisavam daquele encontro para confirmar que não era apenas um delírio das redes sociais. Nervosas, se encontraram pela primeira vez e, no mesmo instante, souberam que aquilo seria real e duradouro. Passaram o fim de semana juntas, mas Kika precisou voltar para casa - mesmo querendo ficar.

Na segunda-feira, já de volta, Kika enviou flores para Bia com um pedido de namoro, explicando que queria mesmo era ter feito isso pessoalmente. Desde então, vivem esse amor, mesmo com algumas horas de distância entre suas cidades. Viajam frequentemente para se encontrar e agora, com a mudança de Kika para Aracaju encaminhada, a rotina promete ficar ainda mais leve. 

No momento da documentação estavam bem empolgadas pensando em como tudo tende a ser mais tranquilo morando próximas, construindo juntas uma nova vida na capital. Amam organizar os looks combinando, até as capinhas dos celulares são pensadas com cuidado. Gostam de se ver como uma meta de casal - recentemente, marcaram presença na parada LGBT de Aracaju e reafirmam que vivem a relação que sempre sonharam: um casal clichê, apaixonado e, como brincam, inimigo do fim.

 Beatriz 
 Kika 
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