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Foi numa manhã que se emendou para um começo de tarde em Salvador que encontrei a Milena e a Luiza (e a Tapioca, claro!). Fizemos as fotos na Praia da Paciência, sentamos num bar para conversar e fui convidada para ir até a casa delas almoçar e conhecer um pouquinho do espaço que conquistaram e construíram juntas nesses anos que se relacionam. Lugar que me contaram com muito entusiasmo existir espaço para cuidar das plantas, para a Tapi correr e brincar, para compartilhar legumes e frutas com os vizinhos, mas que também foi um caminho árduo de percorrer até chegar nele, com perrengues e apartamentos completamente diferentes que passaram.

 

Luiza conta como é diferente a relação que ela aprendeu a construir com Milena, começando pelo o quanto conversam: conversar mudou a sua vida. Nunca tinha se visto num espaço de tanta conversa e de conforto. Sente que respiram juntas, podem ter conversas que duram dias, mas seguem juntas.  Fala também da importância de terem começado a terapia nesses processos que viveram (entre mudanças, casamentos, saírem de casa…) e o quanto foi fundamental para processar seu próprio tempo. 

 

Hoje em dia, aprenderam a pedir desculpas. Não gostam de joguinhos, entendem que não há orgulho próprio na relação, tendem a ter mais parceria assumindo erros ou assumindo funções na casa para que elas aconteçam na rotina. Deixam claro que são esposas, não amigas. Não querem que o relacionamento caia numa amizade, por isso respeitam os espaços individuais e sempre voltam ao lar entendendo o encontro único que possuem enquanto uma família. 



Milena no momento da documentação estava com 40 anos, ela é natural de Salvador, trabalha como atriz e coordena/faz produção de palcos numa casa de eventos no Rio Vermelho. Como hobby, adora fazer jiu jitsu.

 

Luiza no momento da documentação estava com 29 anos, também é natural de Salvador, já trabalhou (e trabalha de vez em quando) enquanto atriz, mas hoje em dia seu foco é enquanto designer. Na pandemia, precisou fazer a transição de carreira porque tudo estava sem perspectiva na área das artes cênicas, o dinheiro apertou e ela foi trabalhar enquanto designer numa orquestra. Como hobby, Luiza pratica tecidos acrobáticos. 

 

Milena também teve seu momento de começar novos trabalhos na pandemia por conta de estar sem perspectivas, foi quando fundou uma marca de sabonetes naturais. Hoje em dia, vende apenas aos mais próximos. 


 

Foi durante o ano de 2018 que se conheceram, quando Milena chegou na companhia de teatro que a Lu fazia parte. De início elas se tornaram muito amigas, se davam bem em cena e sempre queriam contracenar juntas. Acreditam numa sintonia muito grande porque sempre “jogavam” bem juntas, desde cenas de improviso, até cenas já marcadas. E assim foram criando suas amizades. 

 

Ambas tinham seus relacionamentos - e ambos relacionamentos tinham seus momentos bons e ruins. Durante o carnaval, Milena abriu o relacionamento com a ex-companheira dela, e na quarta-feira de cinzas durante uma festa a ex-companheira da Luiza comentou sobre Milena e a Luiza fazerem um casal bonito. Na hora, as duas acharam isso estranhíssimo. Nunca tinham se visto com outro olhar, sempre foram só amigas e não deram muita bola.  

 

No decorrer da festa se beijaram, mas também acharam estranho. Nunca haviam se olhado enquanto paixão ou de um jeito com segundas intenções e só ficou um clima estranho. Como a festa estava sendo em casa, a Milena saiu e foi fazer coisas de casa, ignorando as pessoas que estavam ali, e na hora da Luiza ir embora foi se despedir. Naquele momento, eram só as duas, e aí elas se beijaram novamente.




Naquele ano em diante trabalharam juntas fingindo que nada tinha acontecido e seguindo seus relacionamentos. Saiam, bebiam e até de vez em quando trocavam olhares ou algum carinho, mas nunca chegavam tão perto e no dia seguinte fingiam que nada tinha acontecido. Ambas viviam processos de separação, conversavam bastante quando se encontravam, mas era confuso o que sentiam.

 

Foi quando Lu precisou viajar e antes decidiu conversar com Milena sobre tudo o que estava sentindo. Marcaram na praia (inclusive, a praia que fizemos as fotos) e quando chegou lá recebeu a notícia da Milena: “Vou casar. Você vai se separar. Isso não tem nada pra dar certo.” e nesse ponto concordaram, beleza. Mas concordaram também que sentiam alguma coisa uma pela outra, né?! Só que não iria dar certo, então entraram num acordo que era isso, que teriam que engolir esse sentimento e seguir a vida. Foram para um bar, tomaram uma cerveja e depois, quando precisaram ir embora, chegaram no ponto de ônibus e a Luiza perguntou se elas não iam dar um beijo só. Milena indignada disse “Você não ouviu NADA do que falamos até agora né????” porque acordo é acordo. Deram um abraço e foram embora.

 

Com o tempo, seguiram se encontrando no trabalho, saindo, vivendo como viviam. As coisas não mudaram muito. Até um dia que se beijaram e chamam de “Beijo consciente”, visto que já tinham consciência do que poderia acontecer, tinham conversado e sabiam do que sentiam. A conversa desde aquele dia na praia também deixou claro que elas se gostavam, e daí foi o caminho de entender o sentimento, finalizar os outros laços e trabalharem esse processo interno para darem o beijo consciente.




Antes do “Beijo consciente” Luiza conta o quanto a Milena terminava com ela diariamente. Ela falava “Lu, a gente não pode se falar mais.” E depois de uma hora falava “Esse silêncio tá fazendo sentido pra você?” risos. Era uma confusão. Mas uma confusão que precisavam viver também. Viveram muitos momentos de instabilidade referentes não só a relação das duas, mas os términos dos outros relacionamentos, questões familiares… estava tudo misturado.

 

Em agosto daquele mesmo ano começaram a namorar, quando já tinham saído de suas antigas relações.

 

Durante a pandemia ficaram na casa de uma/da outra, com suas mães… e em fevereiro de 2021 elas se casaram. Foram alugar uma kitnet, da qual visitaram iluminando com a lanterna do celular, vendo baratas no chão, tudo super estranho, mas falaram: é aqui! Juntaram o que conseguiram, compraram o que deu para comprar, construíram o espaço e adotaram a Tapi, uma vira-lata já na fase adulta.




 

Para a Luiza, a única coisa capaz de mudar o mundo é o amor - e junto dele está o respeito, a liberdade. Na relação com a Milena consegue enxergar o quanto elas se amam e querem se ver crescendo juntas. 

 

Hoje em dia estão conversando sobre engravidar, construir uma família, ver o amor crescendo no lar e gerando coisas, ver a entrega que as duas podem ter gerando coisas para além delas. Desejam, também, ter uma base de amor. Hoje em dia enxergam a casa enquanto a base, um lugar seguro para serem quem são. Têm segurança de que são amadas. 

 

Pensam em gerar e educar porque desejam uma cidade que estejam representadas, que seja educada e que também eduque os homens. Falam sobre o quanto é cansativo ouvir coisas dos homens o tempo todo na rua e o quanto também se sentem muito menos seguras ao redor dos homens. Comentam que foram no Festival de Verão de Salvador (um dia antes de nos encontrarmos) e estavam rodeadas de LGBTs e o quanto se sentiram seguras, o quanto isso foi representativo. Desejam uma cidade que não seja violenta.

 Luiza 
 Milena 
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