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A Luciana e a Joana são de Fortaleza, capital do Ceará, mas já moraram em lugares diferentes do Brasil e hoje em dia voltaram para Fortaleza para o nascimento da Maria Flor, a criança mais comunicativa, espontânea e engraçada que o Documentadas poderia ter o prazer de documentar. ♥

 

Lu tem 37 anos, é médica ginecologista e obstetra, responsável por trazer muuuuuitos bebês para esse mundo e deixar muitas mamães seguras na hora do parto. Além da vida profissional incrivelmente disputada, ela é uma mulher que se preocupa em fazer do mundo um lugar melhor em cada detalhe - trata tudo com muito acolhimento, é carinhosa, tem um sorrisão e esteve o tempo todo muito aberta a encaixar o encontro com o Documentadas no meio da rotina de plantões, maternidade e compromissos diários.

 

Joana tem 41 anos, é artista visual e arquiteta. A Jô trabalha tanto para produtoras de Fortaleza e São Paulo (fazendo instalações efêmeras, cenários, conceitos e conteúdos visuais), quanto sendo artista independente, tendo seu próprio escritório e seus projetos autorais enquanto produtora de arte. Nos encontramos no seu ateliê, lugar onde todas ficamos à vontade (principalmente a Flor, que se diverte muito entre as cores e as expressões artísticas) e é muito legal ver como os trabalhos da Joana são diversos e o quanto conseguem conversar entre si. 

 

Além das suas profissões e da correria do cotidiano, elas amam passar o dia se divertindo com o crescimento da Flor, dando espaço para ela explorar as coisas e nas folgas gostam muito de plantar (estão construindo jardins durante a pandemia), viajar (colocar tudo no carro, bagunçar e ir para algum lugar!) conhecer cachoeiras e praias. Além disso, contam que amam cozinhar juntas e que, ao plantar jardins, começaram um projeto sobre o lixo no lugar em que moram, mobilizando os outros moradores do bairro sobre sustentabilidade - usando a arte da Jô nessa conscientização. 



 

O encontro da Lu e da Jô aconteceu como uma “paixão à segunda vista”, porque já eram amigas há muitos anos. A Joana teve um relacionamento longo com uma amiga de infância da Luciana e elas se conheciam desde então, mas cada uma vivia seu relacionamento e nunca se olharam de forma diferente. O tempo passou, elas terminaram seus relacionamentos em momentos diferentes, passaram períodos solteiras e, depois de um tempo, se reaproximaram - surgindo assim, pela primeira vez, um olhar de interesse. 

 

Por um certo receio de suspeitarem de uma traição ou de algo que viesse de antes, visto que de fato se conheciam há muitos anos, elas demoraram quase 1 ano para conseguir oficializar ou assumir esse relacionamento para o grupo de amigas em comum, mas deu tudo certo! Começaram a namorar em 2013 e, como as duas já tinham tido relacionamentos longos o suficientes e decepções amorosas longas o suficientes também, sentaram e conversaram de maneira franca e madura sobre o que desejavam nessa relação: seus medos, seus sonhos, seus desejos e suas inseguranças. 

 

Elas dizem que de certa forma foi tudo até rápido - porque em 2015 elas estavam se casando. A Lu passou em uma residência médica lá em Ribeirão Preto, interior de São Paulo, no mesmo momento em que a organização do casamento estava no auge, então elas combinaram assim: a Joana ia dar um jeito na organização e na decoração e a Lu ia para Ribeirão organizar as coisas da residência e dos estudos. Foi corrido, mas deu certo!



 

A família da Luciana sempre apoiou e sempre admirou a forma que ela lutou pela liberdade e pelo direito de ser quem ela é e de amar quem ela quiser amar. Já a família da Joana, de alguma forma dava apoio à quem ela era enquanto mulher que amava outra mulher, mas no momento do casamento não entendia o porquê daquilo, por qual motivo precisava mostrar aquilo, fazer uma festa assim… Ela insistiu e a festa aconteceu. Mas não só pela festa, pela importância de assinar um documento, de comemorar sim o amor, de celebrar o nosso amor e de ter um documento que nos prove enquanto um casal e que lutamos tanto para ter direito (a algo tão burocrático).

 

Não só aconteceu, como foi incrível! O casamento teve ajuda de vários amigos que doaram um pouquinho de cada coisa para elas - e cada pessoa que estava lá, realmente queria estar. Todos estavam muito felizes, torciam muito pelo amor das duas. Foi um dia muito forte e emocionante, com um pôr do sol maravilhoso. Elas contam que todos que estavam presentes sempre falam de como aquele dia vibrou, que sentiam uma vibração muito forte. E que, no meio da cerimônia, se abriu um arco-íris gigante na praia. ♥



 

Depois do casamento, as duas se mudaram para São Paulo e então começaram uma vida totalmente nova por lá. Fizeram muitos amigos, criaram uma nova rotina e, desde o primeiro momento a Lu nunca escondeu que se relacionava com uma mulher dentro do meio em que vivia (a área da medicina), então todas as pessoas ao redor delas sabiam que eram um casal, sabiam do casamento, de tudo! Isso era bastante novo, se tratando de uma cidade interiorana e de pessoas mais conservadoras, mas era bastante legal ver esse impacto e outras pessoas se inspirando nelas para saírem do armário também. 

 

Como desde sempre a Jô sabia da existência do desejo da Luciana em ser mãe (visto que ela sempre sonhou com isso) e que lá em Ribeirão Preto era o lugar referência para que elas fizessem todo o tratamento de fertilização in vitro (FIV) pelo SUS, então as duas captaram óvulos, o mesmo sêmem, o mesmo doador, e deram início ao processo da maternidade. 

 

Tudo foi registrado por elas em um caderno-livro que se mantém até hoje e que conta essa história para a Flor, sobre como ela foi desejada e amada desde o primeiro momento, por todos ao redor. O processo todo entre tentativas de gravidez durou cerca de dois anos, não foi nenhum pouco fácil, requer muito e as duas se doaram muito para isso, mas também se apoiaram muito e sonharam muito em conjunto. O livro é incrível e muito delicado, conta detalhes desde os sentimentos, até os gastos que envolvem cada pedacinho desses dias tão longos. A Flor, mesmo ainda sendo muito pequena, adora olhar e mexer no livro e fizemos algumas fotos das três com ele em mãos.

 

[No dia em que nos encontramos, a Jô estava dando início a uma nova bateria de exames, pois estão começando o processo para vir aí uma parceira ou um parceiro irmã ou irmão para a Maria Flor. Só temos muita luz e muita vida a desejar! Vocês são uma família incrível!]




 

A Joana conta que para ela, o amor é a base de tudo. Não só o amor romantizado, mas o amor de fato construído, porque o amor é muita luta, muita garra. O amor, dela com a Lu, é um amor de parceria, de entendimento. E, nessa hora, a Lu completa: “É um amor realmente revolucionário. Não existe outra definição senão essa, pela capacidade de transformação que faz numa pessoa.”

 

Quando passam por momentos difíceis, elas conversam sobre tudo, mas entendem que são seres individuais e que têm momentos em que precisam estar sozinhas. A Joana gosta muito de conversar e a Luciana entende e contribui pra isso também. Briga, chora e se abraça! Sempre olha no olho, dá espaço, volta e abraça. É um movimento natural que o próprio corpo tende a fazer. 

 

No fim da nossa conversa, chegamos à conclusão de que quando duas mulheres se juntam para construir uma família, elas saem quebrando tantas barreiras, tantas coisas que socialmente estão na nossa frente há tantos anos, sem nem ver, que é na base da revolução mesmo. 

 

Temos o exemplo de como a família da Jô não ter entendido o casamento delas no começo por não ter visto uma “necessidade” e não ter se proposto a ir, porém, com a chegada da Maria Flor, ser puro grude e reconhecê-la, amá-la e não se ver longe dela - a revolução se mostra nessa construção de família e de amor quando formada pelas mulheres, o segurar a neta no colo consegue quebrar qualquer outra coisa que existe antes, qualquer “muro” colocado, qualquer barreira realmente preconceituosa ou inconscientemente preconceituosa. É uma revolução através do afeto. 

 

E para a Maria Flor é isso que elas desejam: um futuro livre. Sem medo e com respeito, sem julgamentos estruturados. Que ela siga sendo como ela é agora: empática com o mundo e com ela mesma.  

 Luciana 
 Joana 
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